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Startups: Brasil ganha versão local de contrato Safe, que reduz burocracia para o early-stage

O modelo, chamado Mais, foi desenvolvido pela comissão de startups da OAB/RJ e será apresentado nesta quinta-feira

. (Getty Images/Divulgação)
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Karina Souza

Karina Souza

Repórter Exame IN

Publicado em 26 de julho de 2023 às 15:31.

Última atualização em 26 de julho de 2023 às 16:28.

Criar um modelo de contrato simples, que possa facilitar a relação entre startups que estão começando e investidores. Há dez anos, essa foi uma necessidade percebida pela Y Combinator, uma das principais aceleradoras do mundo, ao lidar com empreendedores (de empresas que, por vezes, existiam ainda somente no PowerPoint). Como a firma poderia garantir uma participação no negócio em que estava fazendo aportes, com uma remuneração adequada pelo risco, sem onerar demais o outro lado da mesa com burocracia? A resposta a essa pergunta veio por meio do Simple Agreement for Future Equity (Safe), um modelo de contrato que se tornou amplamente usado nos Estados Unidos e que, agora, pela primeira vez, ganha uma versão brasileira. 

Trata-se de uma minuta de contrato que garante ao investidor que entra no early-stage alguns direitos em rodadas futuras de captação daquela startup. Por exemplo, um desconto no valuation seguinte para aumentar a participação na empresa quando ela se abrir para novos aportes. Nos EUA, o principal formato para exercer esse direito é por meio de um warrant ("bônus de subscrição") com a diferença de que não define um preço, de largada, para exercer a compra das ações.

"A beleza desse instrumento é reduzir o custo de transação para uma empresa em estágio inicial. A gente tinha essa dor no Brasil, especialmente para investimentos muito pequenos, de R$ 5 mil, R$ 10 mil, que exigiam das startups uma necessidade maior de serviços jurídicos. Além disso, elas tinham de aplicar modelos diferentes de contrato com cada um dos investidores, aumentando o risco para os dois lados da transação", diz Felipe Hanszmann, presidente da Comissão de Startups da OAB/RJ e sócio do escritório Vieira Rezende Advogados, ao EXAME In.

O problema foi sentido na pele pelo advogado. Além do trabalho como sócio no Vieira Rezende, Hanzmann fundou, dentro do escritório, a Grey Matter, plataforma de investimento em projetos que tenham desafios regulatórios. Pouco tempo depois, assumiu a presidência dentro da comissão da OAB e, dessa conjunção de fatores, saiu do papel (ou, melhor, criou vida no papel) um novo modelo de contratos similar ao Safe dos Estados Unidos. A versão local se chama Modelo de Acordo de Investimento em Startup (Mais) e deve estar completamente finalizada até dezembro deste ano.

Nesta quinta-feira, a primeira versão do documento, elaborada depois de discussões com diferentes agentes envolvidos no ecossistema do empreendedorismo, será disponibilizada oficialmente ao público em uma cerimônia no Hashtown (RJ) às 18h30 desta quinta-feira. A ideia é que a cerimônia funcione como uma "audiência pública" para explicar a finalidade do documento e possa fomentar novas sugestões sobre o documento que serão recebidas até o dia 10 de setembro.

De todas essas conversas, o resultado final será uma minuta padrão de contratos para startups que estão no início de sua vida, open source, que poderá ser baixada gratuitamente no site da OAB e da Gray Matter. O documento, assim como nos Estados Unidos, não tem como função ser totalmente engessado e estará aberto às alterações necessárias para cada empreendedor. O ponto aqui é trazer uma base comum para fundadores que estão no estágio de investimentos 'Friends and Family' conseguirem ter algum amparo jurídico sem necessidade de gastos massivos com advogados.

"Nada impede que esses contratos também sejam realizados quando chegar a hora de procurar fundos de investimento. Acho ótimo que isso aconteça, mas não é o foco principal por enquanto", diz Hanszmann.

Entrando nos detalhes sobre o Mais, o documento guarda diferenças importantes com o Safe, em razão das diferenças como os modelos jurídicos no Brasil e nos Estados Unidos funcionam. Um ponto importante é a forma como a participação dos investidores é garantida na empresa em que estão fazendo aportes.

Enquanto nos EUA as startups podem emitir warrants (o que no Brasil é o equivalente a um bônus de subscrição, um título que garante o direito de comprar ações de uma determinada empresa), por aqui isso só é possível para S/As e grande parte das companhias que estão começando, vale lembrar, são Limitadas.

“Existe um caminho que pode ser traçado pela comissão de assuntos legislativos, para alterar a regra e viabilizar a emissão desses títulos por sociedades limitadas. Seria um golaço, mas leva tempo, uma vez que ainda depende de projetos de lei”, diz Hanszmann.

Para resolver a situação, o Mais usa como ferramenta o mútuo conversível (empréstimos que podem ser convertidos em capital), uma vez que essa já é a principal alternativa adotada por empresas no país, hoje, e garante aos investidores que estarão blindados em caso de problemas financeiros das startups.

Garantir essa separação entre investidor e a empresa foi, também, alvo de discussões legais recentemente. O marco legal das startups, aprovado em 2021, teve como principal papel deixar claro justamente esse ponto: o fato de que investidores não têm responsabilidades por dívidas tomadas pelas empresas em que aportam. Foi um primeiro passo importante para o ecossistema e, consequentemente, para chegar ao novo modelo de contratos para o setor. 

Não custa lembrar que o early-stage foi um dos segmentos mais resilientes de startups a todas as mudanças macroeconômicas recentes. Enquanto boa parte das empresas que buscavam rodadas Série A, B ou mais do que isso teve de esperar ou reavaliar os planos, o estágio inicial foi uma saída interessante para fundos de investimento que buscavam fazer alocações.

O tema, inclusive, foi um dos destaques do South Summit 2023, um dos principais eventos do setor. Em uma perspectiva mais recente, a Antler, uma gestora focada em potenciais fundadores de startups, selecionando seis ideias para investir, que somam, juntas R$ 4,2 milhões em aportes.

Apesar do cenário de bonança, empresas no segmento também passaram pela maior cautela de investidores no início do ano. Dados da plataforma Distrito mostraram uma queda superior a 90% no volume de aportes em todos os tamanhos de empresas mapeados (early-stage, seed e late-stage). Nos três meses encerrados em março, empreendedores estavam focados em captações de dívida e M&As, como consequência desse cenário, segundo a empresa.

Agora, em meio à retomada do ânimo dos investidores com o Brasil, na esteira das expectativas de redução de juros no país, Hanszmann acredita que o novo documento, que visa trazer maior segurança jurídica aos investidores, vem em boa hora. "É um pleito antigo do ecossistema que ainda não tinha sido atendido, claro, mas vou ficar feliz se ajudar, de quebra, a destravar investimentos", diz o advogado. 

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Karina Souza

Karina Souza

Repórter Exame IN

Formada pela Universidade Anhembi Morumbi e pós-graduada pela Saint Paul, é repórter do Exame IN desde abril de 2022 e está na Exame desde 2020. Antes disso, passou por grandes agências de comunicação.

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