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Aviação

O sonho acabou: fusão de 5,2 bi de dólares de Embraer e Boeing é cancelada

Negócio entre Boeing e Embraer era avaliado em 5,2 bilhões de dólares; brasileira acusa Boeing de fabricar falsas alegações

Fábrica da Embraer em São José dos Campos: Boeing diz que a brasileira não cumpriu as condições para a efetivação do negócio (Germano Lüders/Exame)
Fábrica da Embraer em São José dos Campos: Boeing diz que a brasileira não cumpriu as condições para a efetivação do negócio (Germano Lüders/Exame)

Publicado em 25 de abril de 2020 às 10:23.

Última atualização em 25 de abril de 2020 às 14:22.

A Boeing comunicou nesta manhã do dia 25 que desistiu mesmo do acordo com a Embraer para compra da operação de aviação comercial da empresa brasileira – um negócio de 5,2 bilhões de dólares, conforme era esperado. O prazo para que o acordo fosse selado definitivamente terminou ontem.

Na prática, o que estava acordado há quase dois anos era a compra da unidade aviação comercial da Embraer pela Boeing, na proporção de 80%. A companhia brasileira manteria 20% de participação minoritária como sócia da gigante americana. Sem o negócio, a Embraer “volta” a ser uma fabricante brasileira de aviões.

Pelo acordo, a Boeing pagaria 4,2 bilhões à Embraer no fechamento. O desembolso teria de ocorrer agora, após a assinatura final – ou seja, no meio da crise de liquidez do setor devido à pandemia do coronavírus. Outra parte da transação é que haveria a formação de uma joint-venture para produção do avião de uso militar KC-390.

“A Boeing trabalhou diligentemente por mais de dois anos para a finalizar a transação com a Embraer. Durante os últimos meses, nós tivemos produtivas mas frustradas negociações sobre condições materiais precedentes não concluídas. Nós todos desejávamos concluir isso até a data final, mas não aconteceu”, afirma Marc Allen, presidente da Embraer Partnership & Group Operations. “Estamos profundamente desapontados.”

Após o comunicado da companhia americana, a brasileira reagiu: acusou a Boeing de fabricar falsas alegações para não concluir o negócio. “A empresa acredita que a Boeing adotou um padrão sistemático de atrasos e violações repetidas ao acordo global de operações, devido à falta de vontade de concluir a transação, sua condição financeira, ao 737 Max e outros problemas comerciais e de reputação”, afirma a Embraer em nota pública.

Na sexta-feira, diante da expectativa de fim da transação, os papéis das duas companhias despencaram em seus respectivos mercados. As ações da Boeing caíram quase 6,5% e as ordinárias da Embraer, na B3, registraram perda superior a 10,5%.

Analistas mundo afora apontam que a pandemia do coronavírus e o consequente impacto sobre as companhias aéreas foi a pá de cal para a operação. Trata-se da segunda grande crise para a Boeing em dois anos.

No ano passado, a companhia foi atingida por toda a polêmica em torno da segurança do modelo Max, sua próxima fronteira de crescimento – crise até agora não resolvida por completo. Foram dois grandes acidentes aéreos em poucos meses com o avião. A empresa ainda tem muito dinheiro a ressarcir para as áreas que encomendaram e não receberam o modelo, em valores que não são publicamente conhecidos. A Boeing vem fechando diversos acordos com as empresas de aviação comercial que tinham encomendas, para compensá-las financeiramente pelos atrasos. O conteúdo dos acertos está sendo mantido em sigilo.

Pessoas que acompanharam o desenrolar das conversas apontaram ao EXAME IN que o interesse da Boeing na companhia brasileira diminuiu substancialmente após a crise de reputação do modelo Max – e a dedicação para fazê-lo acontecer também.

O tamanho das companhias continua incomparável. A Boeing encerrou a sexta-feira avaliada na Bolsa de Nova York (Nyse) em 72,6 bilhões de dólares, enquanto a Embraer fechou o dia em 1 bilhão de dólares, conforme a cotação dos recibos americanos de ações (ADRs). O valor em bolsa da brasileira, portanto, está muito abaixo dos preços usados para o acordo, um dos fatores que aumentou a pressão pela não conclusão.

Importante ressaltar que a Embraer listada na B3 continuaria existindo, como dona do caixa gerado pelo pagamento da Boeing mais 20% do negócio combinado de aviação comercial e 51% da sociedade para o KC-390. Os investidores brasileiros receberiam, em razão da venda, um dividendo especial de 1,6 bilhão de dólares. Descontados os impostos, restaria no caixa da empresa 1,4 bilhão de dólares.

Na nova Embraer, o segmento de jatos executivos e a operação de carga e militar seriam o “core business”. Agora, a companhia fica com a operação comercial, sem o caixa e sem a joint-venture para o KC-390.

Desde fevereiro do ano passado, os acionistas da Embraer deixaram o negócio pré-aprovado, no aguardo das condições precedentes para ser executado plenamente. A assembleia que avaliou o assunto contou com presença de 67% do capital e aval de 97% dos participantes.

O governo brasileiro, dono de uma golden-share (uma ação com super-poder de veto, chamada de ação de ação de ouro) na Embraer, também já havia dado a benção ao acordo.

Em janeiro deste ano, como parte desse esforço, a Embraer anunciou a conclusão da separação, em uma nova empresa, das atividades de aviação comercial – para que pudesse ser absorvida pela Boeing. Um esforço nada pequeno que será desperdiçado. Sabia-se que era parte importante das condições.

Mas, além dessa segregação e do aval dos reguladores setoriais e da concorrência, as companhias nunca tornaram público quais seriam as tais condições precedentes. Neste momento, não se sabe o que exatamente deu errado. A autoridade europeia de análise da concorrência havia esticado seu prazo de análise para 7 de agosto – mais uma condicionante. Também não há informações públicas a respeito de eventuais multas pela não execução do acordo, como é comum haver previsão em contrato em transações desse porte.

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