"A Hering deve oferecer todo o portfólio de serviços digitais para multimarcas nos próximos dois a três anos", diz Jatahy, em entrevista ao EXAME IN.
Soma reforça importância do atacado e quer crescer pelo menos 25% no canal em 23
Hering e Farm Global foram os principais destaques apresentados em evento do grupo nessa sexta-feira
Karina Souza
Repórter Exame IN
Publicado em 1 de abril de 2023 às 09:32.
Última atualização em 3 de abril de 2023 às 16:59.
“O maior canal de crescimento para a Hering em 2023 será o atacado.” A frase, de Roberto Jatahy, CEO do Grupo Soma (SOMA3), dá o tom do que a companhia espera daqui para frente em relação à empresa fundada em Santa Catarina: seguir, finalmente, com os principais planos anunciados no momento da aquisição. Depois de 'arrumar a casa', com fornecedores e logística, uma tarefa cumprida de 2021 para cá, o grupo de moda está pronto para dar o próximo passo na estratégia de crescimento com multimarcas -- acompanhado de um olhar atento às lojas próprias. Com base nos resultados conquistados ao longo dos últimos anos pelo grupo, dá para ter uma ideia do tamanho do potencial a ser explorado daqui para frente para a marca, hoje responsável por mais de 40% da receita do Soma. De 2019 a 2022, a companhia apontou que vendas da Hering para multimarcas cresceram 9%, totalizando R$ 816 milhões no último ano. No mesmo período, as vendas do grupo (ex-Hering), aumentaram 63,3%, fechando 2022 em R$ 654,3 milhões. Em 2023, a companhia prevê, no agregado geral, um aumento de pelo menos outros 25% só com esse canal.
Os planos foram apresentados nessa sexta-feira (31) durante o Soma Fashion Experience, o principal evento do grupo de moda para o público de representantes de vendas e do atacado, e que o EXAME IN acompanhou de perto. É um verdadeiro salão de negócios. Na data, tradicionalmente, as multimarcas aumentam em 20%, em média, o pedido realizado em relação ao padrão observado no restante do ano. Com público recorde nesta edição, cerca de 3 mil pessoas, o encontro trouxe, além de um discurso de agradecimento de lideranças da companhia, algumas novidades em relação às edições anteriores: ativações de marcas parceiras (como a Lola Cosmetics) e, principalmente, uma iniciativa de capacitação em marketing digital.
O foco em tecnologia é um dos diferenciais do grupo responsáveis pelo crescimento do canal ao longo dos últimos anos. Na pandemia, com lojas fechadas e atacadistas atrasando pagamentos, o grupo se viu obrigado a pensar em uma alternativa capaz de trazer faturamento para este grupo. Dessa reflexão, surgiu o código de vendedor, um case de sucesso para a empresa.
Basicamente, por meio dele, as multimarcas afiliadas têm direito a criar um código para venderem os produtos do próprio site do Grupo Soma, seguindo modelo semelhante ao adotado pelas vendedoras das lojas das marcas. A empresa ‘empresta’ o estoque para que eles vendam — e, no fim, caso o cliente compre, eles recebem uma comissão. Mas não qualquer uma: um crédito para abaterem na próxima compra. Esse modelo segue até hoje.
Mais do que isso, podem vender o produto comprado no marketplace do grupo, o Soma Place, que hoje tem mais de 13 milhões de cadastros. Nessa dinâmica, o vendedor paga 20% do valor da venda como comissão ao grupo, que cuida de toda a logística de entrega. É uma solução também desenvolvida da pandemia para cá, quando os lojistas começaram a colocar os produtos do grupo em outros marketplaces -- e a companhia viu a oportunidade de trazer esse tráfego para dentro de casa. Desde que a iniciativa foi implementada, houve um aumento de 15% a 20% na audiência do site, por causa do marketplace. Além disso, marcas como Animale e Maria Filó tiveram um crescimento de mais de 25% em recorrência de clientes.
“A multimarca não tem custo com a transação financeira, não precisa ter custo de marketing e de impulsionamento, muito menos de aquisição de clientes, que é caríssimo. E o melhor de tudo, em vez de vender em outro marketplace, mais genérico, ele está vendendo num ambiente de marca criado para aquilo, onde já existe uma busca natural por aquele produto. É como se a gente pendurasse a roupa comprada pelo atacado na nossa loja”, diz Thiarles Borges, diretor comercial de atacado do Grupo Soma, em entrevista ao EXAME IN. Hoje, cerca de 10% das 12 mil multimarcas cadastradas no sistema do Soma usa esse serviço e, só com esse público, a companhia conseguiu gerar uma receita de R$ 100 milhões ao longo do último ano.
Mais tecnologia, mais vendas
Daí o foco em tecnologia na edição de 2023 do evento com multimarcas. Ficou claro no discurso de Borges, na abertura do evento, e também em um vídeo exibido no local, finalizado com a frase: "Vender no Soma Place é tão fácil quanto combinar T-shirt e calça jeans". Ao disseminar conhecimento sobre como esses recursos funcionam -- além de outros, como o marketing em redes sociais, por exemplo -- o Grupo Soma quer aumentar o nível de adesão ao seu portfólio de produtos digitais. Exemplo disso é uma ferramenta lançada no evento, chamada Mais Views, que consiste em um treinamento 100% gratuito oferecido pelo grupo para todos os vendedores que se interessarem, baseado no treinamento oferecido pela companhia aos colaboradores de lojas próprias.
“Hoje, minha maior lojista cadastrada em produtos digitais vende, no código de vendedor, R$ 2 milhões. E ela fica em uma cidade muito pequena no nordeste do país. Diante desse sucesso, e das barreiras quebradas até aqui, queremos que eles estejam cada vez mais próximos do ambiente digital”, diz Borges.
O potencial de crescimento do canal por meio dos serviços on-line deve ser ainda mais reforçado pela entrada da Hering nesses serviços. Hoje, a parte de digitalização com multimarcas da empresa ainda está muito mais centrada em desenvolver o sistema de vendas para o atacado. "O foco é trazer mais inteligência de estoque para o vendedor, indo além da compra em si", diz Vinicius Gabriel Geiger Porta, diretor de multimarca dedicado à Hering. A nova plataforma, atualmente em desenvolvimento, é uma versão adaptada do que já existe dentro do Soma.
Apesar dessa trajetória de digitalização ainda estar no início para a marca adquirida em 2021, não deve demorar para que ela esteja totalmente integrada ao que as demais marcas conseguem oferecer.
Antes de entrar nesse ponto específico, a companhia, pós-aquisição, focou em retomar a confiança do público de multimarcas e franquias, organizando logística e cadeia de distribuição. Em 2021, no ano em que foi comprada, a taxa de ruptura da Hering era de 25% -- a do Soma, para referência, era de 9%. Hoje, segundo o CEO, a questão já foi resolvida.
Farm Global deve ultrapassar nacional em três anos
Enquanto a Hering se prepara para estar totalmente integrada ao que o grupo já oferece às multimarcas em serviços digitais, outra marca, no grupo há mais tempo, continua sendo um dos principais destaques em ganho de receita com este público: a Farm. Especialmente a divisão global. De acordo com os dados apresentados pelo Soma, as vendas para o atacado cresceram 212,4% de 2019 para cá, faturando R$ 222,4 milhões em 2022.
Nas contas de Marcello Bastos, co-fundador da marca, a Farm Global deve ultrapassar a brasileira em receita nos próximos três anos. Em 2022, a Farm Global faturou R$ 490,9 milhões, quase metade do total da divisão brasileira, com um crescimento de 80% sobre o ano anterior -- em 2021, a divisão respondia por um terço das vendas nacionais.
O caminho para esses resultados, segundo Bastos, é alimentado principalmente pelo interesse de empresas internacionais na marca carioca. Tudo começou com o Le Bon Marché, em uma loja de verão localizada em Paris, com pouco mais de 30 metros quadrados -- que virou, em pouco mais de um ano, uma loja de mais de 200 metros quadrados. O sucesso da empresa na Europa chamou a atenção de outra loja de departamento de renome, mas dessa vez na Itália, a Rinascente. Nessa semana, a Farm inaugurou a primeira loja em Milão, e já planeja os próximos passos em outras cidades italianas: pelo menos outras oito lojas devem ser inauguradas no país em breve. Isso sem falar nos planos de franquias para outras regiões, como México e Oriente Médio.
Em meio a todo esse movimento de expansão internacional, o executivo voltou ao Brasil para prestigiar, também, o relacionamento com as multimarcas locais. Questionado a respeito de como os brasileiros veem o foco da Farm para outros canais e outros países, Bastos afirma que se trata de uma relação consolidada. "Esse reconhecimento da Farm Global impulsiona vendas por aqui e, além disso, temos um trabalho de longa data com o público local. Hoje, por exemplo, as multimarcas anunciam primeiro do que a gente as novas coleções", diz o executivo.
Na passarela
No evento, a Farm foi a única entre as maiores marcas (em receita) do grupo a não realizar um desfile para mostrar as novidades da coleção. Ficou restrita aos estandes no local -- no plural mesmo, um para as roupas e outro para sapatos e acessórios.
A passarela foi aberta pela Maria Filó, que trocou de diretora criativa recentemente. Quem assumiu o cargo foi Maria Rita Magalhães Pinto, ex-Ateen, que trouxe um desfile com temática 'boho chic' (ou "cigana", como definiram alguns dos presentes na plateia) para sua primeira coleção dentro do Soma. No último ano, a marca cresceu 11,5% em receita, faturando R$ 193,4 milhões.
A Dzarm estreou na passarela do Soma neste ano, pela primeira vez, bem como a Hering. Em um dos últimos desfiles da noite, a marca de roupa básica trouxe um show de Marisa Monte e Seu Jorge, que animou o público, reforçando o atributo de brasilidade. No maior estande do evento, a empresa trouxe uma coleção bastante alinhada ao que já se vê nas lojas: roupas coloridas, jovens, que vão do trabalho ao passeio. Ficou mais claro, por lá, o foco em athleisure, com a coleção de esportes ocupando um espaço central.
A Foxton focou em trazer experiências para quem estava por lá. Na fachada do estande, uma passarela virtual em que era possível acompanhar a coleção mesmo fora do desfile. Dentro, chope e café à vontade. A Animale trouxe uma coleção bastante urbana e reforçou o viés de arte ligado à moda. No local, além das roupas (e da coleção Oro, de jóias) era possível encontrar quadros alinhados com a estética da nova coleção.
Diante do evento lotado e de um crescimento contínuo com multimarcas, é quase impossível deixar de perguntar para os executivos qual é o diferencial da companhia para lidar com esse público. Em uma versão resumida, as palavras que apareceram foram confiança, tecnologia, agilidade e marcas fortes. Atributos que a companhia pretende continuar mantendo em alta daqui para frente.
"Pensar grande nunca sai de moda" foi uma das primeiras frases a aparecer na abertura do evento realizado nessa semana. O intuito era o de encorajar o público a entrar de vez no ambiente digital, mas, mais do que isso, o conjunto de palavras transmitiu, ali, a forma como o grupo se relaciona -- e quer se relacionar -- com o atacado.
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Karina Souza
Repórter Exame INFormada pela Universidade Anhembi Morumbi e pós-graduada pela Saint Paul, é repórter do Exame IN desde abril de 2022 e está na Exame desde 2020. Antes disso, passou por grandes agências de comunicação.