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Economia deve orientar a política e o Copom desmontar incertezas

Faltam dados para uma avaliação precisa de algumas variáveis, o que pode reforçar a cautela do Copom que deve levar a Selic a patamar ‘neutro’

“A história mostra que sequência de choques é um estímulo à indexação. Em meio às pressões, há dúvida sobre o real estado da economia”, diz Roberto Padovani (CICCaxias/Divulgação)
“A história mostra que sequência de choques é um estímulo à indexação. Em meio às pressões, há dúvida sobre o real estado da economia”, diz Roberto Padovani (CICCaxias/Divulgação)

Publicado em 4 de agosto de 2021 às 09:27.

A economia é responsável por 85% da melhora na avaliação de governos no Brasil. Em 83 trimestres, apenas oito não tiveram resultados animadores porque eventos pontuais atropelaram a economia: a crise da falta de oxigênio em Manaus em meio à pandemia; a greve dos caminhoneiros em 2018; o  vazamento do áudio com a conversa entre o ex-presidente Michel Temer e o empresário Joesley Batista, um dos donos da JBS. Outros cinco trimestres compartilham uma característica: foram os primeiros de novos mandatos presidenciais, informa ao EXAME IN Roberto Padovani, superintendente e economista-chefe do BV, autor do monitoramento.

“Quase sempre, portanto, a economia explica a avaliação do governo e a crise hídrica poderá ser um evento não econômico que poderá pesar na eleição em 2022 que será mais competitiva. O debate será econômico e o mercado financeiro, hoje menos ligado às eleições, deverá questionar o quanto o próximo governo será reformista”, pondera Padovani que vê na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) que termina nesta quarta-feira um evento particularmente importante na formação de expectativas.

“O Copom tomará sua decisão em um momento de economia robusta aqui e lá fora e em meio a um choque de preços incomum. Mas, no caso do Brasil, com sinalização de inflação muito próxima à meta no ano que vem. O comitê deve elevar a Selic em 1 ponto percentual, para 5,25% e anunciar aumento da mesma magnitude para setembro. Mesmo que o juro chegue a 8% em 2022, que não é nosso cenário, a alta não deve comprometer a retomada. A taxa é alta comparada a 2%, mas não é alta para os padrões que já observamos no país.”

Embora ponderado, Padovani, que projeta expansão do PIB em 5,3% em 2021 e 2% em 2022, não vê o futuro desprovido de riscos. “A inflação calculada em 12 meses está chegando a 9%, o IGP-M bateu 37% na maior variação desde 1996, a economia está reabrindo e os preços de serviços subindo sem que os preços de outras atividades estejam caindo. A história mostra que essa sequência de choques é um estímulo à indexação. Em meio a essas pressões, há dúvida sobre o real estado da economia. Estará aquecida de fato, com taxa de desemprego em 14,7%? Como avaliar a ociosidade da economia?”

O economista-chefe do BV observa que faltam dados para uma avaliação mais precisa de algumas variáveis, o que pode reforçar a cautela do Copom. Ele entende que o comitê deve levar a Selic ao patamar neutro, embora não esteja claro para o mercado qual é esse nível. “A política monetária deve estar ajustada ou normalizada para se contrapor às incertezas. Novas variantes são sempre uma dúvida, mesmo que cerca de 70% dos brasileiros possam estar vacinados com a 1ª dose contra a Covid-19 em setembro. Nos Estados Unidos, os juros vão subir. É uma questão de tempo. E, aqui, temos a crise hídrica como agravante, além do calendário eleitoral.”

Estrago populista

Roberto Padovani não vê, contudo, perspectiva de adoção de medidas econômicas populistas nos próximos meses. Ele reconhece que a essência da política é tentar alavancar o crescimento. Mas lembra que populismo na economia tem custo muito elevado quando uma crise se instala. “Temos passado por vários testes de estresse nos últimos meses. Decisões populistas hoje teriam custos muito maiores. Se o governo gastar mais e romper o teto de gastos, o endividamento cresce, aumenta a pressão sobre o câmbio, sobre os preços na economia e sobre os juros. Resultado: a confiança cai, as condições de renda e crédito pioram. E economia fraca é o pior resultado para um político”, afirma.

Mas, ainda que impere o bom senso e a economia traga boas notícias em 2022, Padovani conta com um período de volatilidade financeira. Ele acredita que já estamos nela, mas a tendência é de agravamento. O Ibovespa segue instável e atrasado na comparação com índices internacionais e o dólar não converge para o patamar de R$ 4,70 apontado por fundamentos. Mesmo assim, alguns eventos não estão adequadamente precificados. Justamente por isso, o desafio do Copom para manter as expectativas ancoradas segue sendo elevado.

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