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Clássica dobradinha: PIB forte traz fluxo para bolsa subir e dólar cair

Atividade do 1º trimestre supera expectativas e abafa até preocupação com crise hídrica

Surpresa positiva deflagra revisões para o PIB de 2021 e alimenta expectativas com a próxima reunião do Copom (Germano Lüders/Exame)
Surpresa positiva deflagra revisões para o PIB de 2021 e alimenta expectativas com a próxima reunião do Copom (Germano Lüders/Exame)

Publicado em 2 de junho de 2021 às 09:44.

Última atualização em 2 de junho de 2021 às 10:45.

A surpresa de um PIB maior que o esperado na divulgação de ontem, com um crescimento de 1,2% no primeiro trimestre, deve ajudar o Brasil a atrair mais investimento estrangeiro. Aqui, até o pouco é muito, diante da liquidez internacional — em especial porque o país tem tido dificuldade de atrair recursos. Mesmo assim, a bolsa já acumula entrada de R$ 35,5 bilhões de janeiro a maio. O volume empata com o último melhor ano do país: em 2017 inteiro, o Brasil atraiu R$ 35,7 bilhões. O saldo de cinco meses ainda anula as perdas de 2018 e 2019 e engole o modesto ingresso do ano passado.

O fluxo externo é para lá de bem-vindo, pois chega num momento em que o doméstico está distante do vigor apresentado nos últimos anos. O capital ajuda a ativar os emissores de ações e dívida privada e alimenta expectativas positivas. A Petrobras, por exemplo, acaba de anunciar que deve voltar a captar no mercado externo, com papéis com vencimento em 2051 (o volume ainda não foi anunciado). Não por acaso, a próxima onda de ofertas públicas iniciais (IPO) são operações maiores e que devem contar com forte esforço de vendas fora do Brasil. Quando se olha o saldo doméstico de bolsa, é possível ver que as pessoas físicas e os investidores institucionais seguem vendedores.

O resultado do PIB é emblemático também por desencadear uma onda positiva de revisões para o PIB deste ano, o que produz impacto imediato na Bolsa e no câmbio. E para melhor.

Acima de 128 mil pontos, o Ibovespa é favorecido pela baixa concentração de negócios em ações de tecnologia e ancorada por setores que valorizam com a recuperação da atividade doméstica e externa com o pulso das commodities. O dólar embicou a R$ 5,14 por uma tripla interpretação de eventos: a economia mais forte poderá extirpar a “normalização parcial” da política monetária do discurso do Banco Central, antecipar o aumento da Selic e o juro mais alto deverá chamar investidores para a renda fixa. E sem que a Bolsa vitaminada pelo PIB perca atratividade sobre o capital estrangeiro.

A ideia de ganha-ganha, que vale para o mercado financeiro, não vale para o cidadão e tampouco para o BC – ambos lidam com pressões inflacionárias turbinadas pela conta de energia. A preocupação com a crise hídrica foi tragada pelo entusiasmo com o PIB acima do esperado.

“O PIB do primeiro trimestre surpreendeu positivamente. Há poucos meses, a expectativa era de PIB negativo. As projeções para o ano, que orbitavam 3%, agora esticam a 4,5% com risco para cima. O Brasil mostrou capacidade de lidar com restrição de mobilidade, a economia avançou e a crise hídrica não deve comprometer o PIB deste ano. A inflação, sim, ficará mais pesada”, afirma o economista Marcos Mollica, gestor de multimercados do Opportunity, que prevê IPCA de 5,5% este ano e de 4% em 2022.

Mollica avalia que as pressões nas cadeias produtivas serão agravadas pelo setor de serviços e podem chegar aos preços ao consumidor. O acionamento das usinas térmicas também conta. Entretanto, ele considera a questão hídrica administrável com mudança no uso da matriz energética. “Para 2022, temos um risco hídrico razoável, mas que pode ter um curso diferente a depender das chuvas esperadas para o período de outubro a dezembro.” Já a apreciação do real ante o dólar tende a aliviar a inflação. E alguns vetores favorecem o real, diz Mollica: a expansão da atividade acima do esperado, o cenário externo positivo de oferta abundante de dinheiro nas principais economias, o real atrasado em relação a outras moedas pares do Brasil, o juro mais alto e o resultado fiscal também melhor que o esperado – apontando para relação Dívida/PIB de 85% e não de 95% ou 100%.

Fábio Akira, economista-chefe da BlueLine, alerta para o impacto do PIB do primeiro trimestre sobre os investidores estrangeiros. “O efeito no dólar e sobretudo na Bolsa é importante. O PIB é um indicador global, compreendido pelos investidores e o resultado do primeiro trimestre mostra melhora da economia na margem. Atividade melhor e contas públicas mais favoráveis falam aos investidores. Um exemplo da relevância dos dados, as primeiras revisões positivas para crescimento, a partir da divulgação de indicadores coincidentes entre março e abril, mudaram o mercado. Eles inverteram sinais. Inicialmente, o discurso oficial, inclusive, era de um primeiro trimestre negativo por falta do auxílio emergencial e recrudescimento da Covid-19”, afirma Akira que chama atenção para os indicadores também positivos da economia global.

Akira vê “paradinha” no Copom

O economista-chefe da BlueLine vê o estrangeiro voltando ao Brasil, mas pondera que esse investidor é heterogêneo, “mais que os domésticos”. “Os investidores do ‘fast money’ perceberam a mudança das projeções, mas o investidor estrangeiro de médio e longo prazo vem saindo do país desde 2015, quando perdemos o grau de investimento das agências de rating.”

Akira não despreza os desafios que o Brasil tem a enfrentar em 2022. “Temos eleições, reformas estruturais a consolidar e uma crise hídrica que merece, porém, uma segunda leitura. A nossa matriz energética é mais flexível e temos à frente um período de meses [e regime de chuvas] para que a crise se cristalize. Além disso, há o fato de o próprio governo estar tratando de maneira mais séria a crise hídrica do que a Covid-19. Uma demonstração sintomática do quanto o governo está levando a sério o risco dessa crise hídrica foi a reunião do ministro de Minas e Energia com o executivo Pedro Parente, que liderou a Câmara de Gestão da Crise de Energia em 2001, durante o governo Fernando Henrique Cardoso.”

Ao contrário de alguns de seus pares no mercado financeiro, o economista-chefe da BlueLine – que via o PIB na faixa de 3,5% a 4% antes do resultado do primeiro trimestre e agora trabalha com projeções entre 4% e 4,5% - vê o Copom testando a “paradinha” em sua reunião de meados de junho para avaliar as condições da economia. E, nesse sentido, informações relevantes a observar serão apreciação da taxa de câmbio, fluxo de capital estrangeiro e dimensão de riscos fiscais.

José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Fator, concorda que o PIB do primeiro trimestre veio acima do esperado, mas considera sua composição fraca. “A composição do PIB não é animadora. A alta veio da formação bruta de capital fixo com componente importante decorrente da troca de algumas importações por alta de ativos produtivos. Do lado do consumo, sobretudo, tudo indica que a falta do programa emergencial foi relevante, o que recomenda cautela sobre o otimismo com o segundo trimestre, embora a base de comparação interanual será favorável a 2021”, pondera.

Gonçalves avalia que as dúvidas sobre a trajetória da pandemia, vacinação e distanciamento, se combinam a outros riscos importantes: de a recuperação não implicar crescimento adicional e dos efeitos da política fiscal contracionista e monetária menos expansionista. “Em que pese tais riscos, os analistas revisaram sua expectativa de crescimento em 2021 para níveis elevados. Mantemos a cautela e estimativa de crescimento em torno de 3%”, informa o economista.

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