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B3

As estreias na B3 e o "lado B" da dependência do fluxo local para ações

Cenário difícil para fechar IPO e estreias em baixa refletem falta de ânimo de fluxo doméstico e internacional para bolsa no Brasil

Bolsa: dados da Anbima mostram que saldo no ano para fundos de ações acaba de ficar positivo, em R$ 24 milhões (Germano Lüders/Exame)
Bolsa: dados da Anbima mostram que saldo no ano para fundos de ações acaba de ficar positivo, em R$ 24 milhões (Germano Lüders/Exame)
GV

Graziella Valenti

17 de maio de 2021 às 17:06

As estreias em baixa deste pregão de segunda-feira, dia 17, com GetNinjas e G2D, são o reflexo da "dor e a delícia"  de o fluxo doméstico estar dominando a cena do mercado de capitais no Brasil como nunca se teve notícia antes. Só agora, no meio de maio, as captações de fundos de ações saíram do vermelho. Até poucos dias atrás, o saldo líquido registrado na Anbima para essa categoria ainda era de resgates. O cenário contrasta com 2020, quando bolsa era o hit, mesmo com saques e mais saques dos estrangeiros.

No dia 11 deste mês, o saldo acumulado de entradas e saídas nas carteiras dedicadas à bolsa no ano ficou R$ 24 milhões no azul. Em janeiro e fevereiro, os investidores resgataram nada menos do que R$ 17 bilhões. Em março houve aportes de aproximadamente R$ 8 bilhões, em abril vieram outros R$ 7 bilhões e agora neste mês, mais R$ 3 bilhões, até agora. Mas a coisa está para lá de devagar, pensando que em 2019 e 2020 esse segmento atraiu R$ 160 bilhões em aportes.

Sempre se falou que o investidor doméstico precisava ser maior e prevalecer no país. Mas isso era sem o estrangeiro ir embora. O país não tem poupança  para o mercado financiar expansão econômica com a mesma autonomia que ocorre em outros países. Resultado: o giro médio diário da bolsa em abril foi 14% menor em reais e 9% inferior em dólar — e isso depois de já ter caído em março.

Não é de se estranhar, portanto, que GetNinjas, depois do sufoco para fechar o livro do IPO na semana passada agora enfrente uma estreia em baixa: as ações recuavam 2,10%. O mesmo vale para G2D, a holding tech da GP Investimentos, cujos BDRs negociavam em queda de quase 9,5%.

A semana passada foi considerada uma das piores para se fechar uma oferta incial. A sombra da inflação americana segue encobrindo o brilho dos ativos cujas perspectivas de retorno estão em futuro de longo prazo. E ainda a volatilidade veio com tudo para coroar — um dos piores venenos em uma precificação.

O desempenho diz mais sobre o momento — e a bolsa brasileira, de forma geral — do que sobre as companhias. Dotz não conseguiu fechar sua oferta pública inicial nem mesmo com um livro com elenco de notáveis (de Ant Financial, a Softbank e Velt) e vai tentar nesses próximos dias por meio de uma oferta restrita, e Infracommerce também foi por esse caminho. Sem contar tantas outras que acabaram desistindo.

Ainda que tenha voltado a ficar em terreno positivo, não há ninguém fazendo grandes comemorações na indústria com o fluxo para a B3. Enquanto isso, a renda fixa já captou R$ 80 bilhões no ano e os fundos multimercados, quase R$ 60 bilhões.

Mês após mês, os investidores institucionais nacionais estão entre os principais vendedores do mercado secundário de ações. Em maio, só até quinta-feira passada, dia 13, já tinham tirado R$ 6 bilhões. O investidor internacional até tem aparecido, mas é pouco ainda. Nesse mesmo intervalo de maio, compraram R$ 5,4 bilhões.

Depois do saldão de 2020, o investidor se retraiu no começo deste ano com a bolsa e o ritmo de aberturas de conta de pessoas físicas também refreou, passou de uma média superior a 135 mil mensais no ano passado para pouco mais de 110 mil ao mês neste ano. Olhando de maneira mais aberta para a economia, de forma geral, até a poupança, depois de bater R$ 1 trilhão no ano passado, estava registrando saques atrás de saques — o que diz sobre a situação da atividade no Brasil.

No ano passado, o cenário era bem outro. Em março, por exemplo, quando o estrangeiro sacou da bolsa nada menos do que R$ 25 bilhões em 30 dias, a pessoa física comprou diretamente, via home broker, R$ 17 bilhões e os fundos de ações ainda levantaram R$ 7 bilhões — e isso porque era o auge do estresse.

O conservadorismo está na cabeça de todos e as commodities em alta estão concentrando atenção para quem manteve a fé na renda variável. A briga é de cachorro grande. A B3, com sua cara totalmente old economy, tem Petrobras com promessa de dividend yield histórico e o minério com recordes sucessivos, enquanto Vale segue descontada no comparativo com outras mineradoras mundo afora.

Por isso, está difícil para novatas conseguirem chamar atenção. E para acessar o investidor estrangeiro só mesmo transações grandes, como é o plano, por exemplo da Raízen, do grupo Cosan — a empresa já fez uma rodada de apresentações lá fora e deve voltar novamente antes de efetivamente pedir registro da oferta. Pic Pay, por sua vez, já foi direto para a Nasdaq.

Ainda assim, a lista de pretendentes da CVM teve novas adesões: Armac, Unifique Telecom, Multilaser e Invest Tech, mais uma holding de investimentos no universo digital. Parece que só um milagre de boas novas para animar o segundo semestre.

Mais um número para quem gosta

Outro dado interessante que as mil e uma planilhas da Anbima mostram é que o estoque de patrimônio investido em ações por aqui — e daí vale fundos de ações, multimercados, previdência e o que mais houver — caiu de quase R$ 760 bilhões para R$ 747 bilhões, de dezembro a março (com a bolsa quase no zero a zero). É um outro número que mostra todas essas outras coisas descritas acima. Enquanto isso, os investimentos dos brasileiros no exterior saíram de R$ 55 bilhões para R$ 67 bilhões, nesse mesmo período.

Para quem decide. Por quem decide.

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