Via: acordo com Bradesco pode trazer R$ 3,25 bi em 5 anos e bem mais até 2037
Contrato, que substitui e renova o atual, prevê compartilhamento de receita no volume de transações
Publicado em 16 de novembro de 2022 às 06:54.
Última atualização em 16 de novembro de 2022 às 14:42.
A gestão da Via (VIIA3), dona das Casas Bahia e do Ponto Frio, está tirando do papel o discurso de que “dentro de casa tem muitos ativos para monetizar”, que se alimentam da força das marcas do grupo. Somente a Casas Bahia, costuma citar o presidente Roberto Fulcherberguer, aparece, espontaneamente, em mais de 10 músicas brasileiras — e isso que eles tenham contado sem pesquisar muito. O esforço de buscar valor para esses ativos não é de hoje, mas veio agora a maior tacada nessa direção. Junto com o balanço do terceiro trimestre, foi feito o anúncio de um acordo com o Bradesco (BBDC4), relacionado à emissão e movimentação de cartões co-branded nas Casas Bahia, que pode trazer R$ 3,25 bilhões até 2027 em antecipação de receita. O valor total do acordo, porém, é bem maior — mas não revelado. E a duração, também é: 15 anos. A companhia terminou segunda-feira, dia 14, pré-feriado, avaliada em R$ 4 bilhões na B3.
A mensagem por trás do negócio é o discurso da companhia sobre valor: a disposição do pagamento, antecipado pelo acesso a sua base de clientes, seja física, seja online. Do montante total divulgado, R$ 350 milhões, já creditados no caixa da Via, inclusive, são uma espécie de "prêmio" só pelo acesso ao cliente no balcão da Casas Bahia. É como se o Bradesco dissesse quanto vale o pedágio de chegar aos consumidores da Via.
A novidade veio bem a calhar. Ao fim de setembro, a Via tinha R$ 3,4 bilhões de liquidez, considerando caixa, recebíveis de cartões e outros, para um total de R$ 4,2 bilhões em dívida. O terceiro trimestre costuma ser pesado em capital de giro para varejistas, com preparo de estoques para Black Friday, Natal — e este ano também para a Copa do Mundo. Somente entre fim de junho e setembro, a posição de recursos encolheu R$ 900 milhões. Mas o número não trouxe susto: já veio com a informação de que entraram na conta bancária, por causa do acordo com o Bradesco, R$ 1,75 bilhão na semana passada. Além dos R$ 350 milhões pelo acesso ao balcão, R$ 1,4 bilhão foram creditados na forma de antecipação de receita. “Um montante que representa 44% do valor de mercado da companhia”, como apontou Luiz Guanais, analista de varejo do BTG Pactual (mesmo grupo de controle da Exame), sobre o reforço imediato de caixa. Com o dinheiro, é como se a liquidez da empresa estivesse em R$ 5,2 bilhões.
O valor exato do acordo com o Bradesco é desconhecido. Depende de como os negócios, e suas muitas variáveis, vão se comportar nos próximos 15 anos. Há quem, no mercado, diga ter potencial superior a R$ 6 bilhões, ao longo do período. O acordo para emissão de cartões com a bandeira do Bradesco entra em vigor já, substituindo o atual, que venceria em 2029. Nessa troca do antigo pelo novo, contou André Calabro, o homem da Via à frente das operações financeiras, em entrevista ao EXAME IN, novas fontes de receitas foram adicionadas ao acordo. Na versão anterior, a Casas Bahia recebia apenas pela emissão de um novo cartão. Agora, também participa na formação de receita desse cartão, ou seja, no quanto ele movimenta, dentro e fora da Via.
Ao fim de setembro, a Via somava 5,210 milhões de cartões co-branded, considerando Casas Bahia, com Bradesco, e Ponto Frio, com Itaú. Como a Casas Bahia é substancialmente superior ao negócio do Ponto Frio, fica fácil imaginar que responde pela maioria dos plásticos emitidos — ainda que a Via não abra esses dados. O total movimentado por esses cartões chegou a R$ 5,7 bilhões no terceiro trimestre, 16% mais do que um ano antes.
“A gente expandiu, e muito, nossa base de cartões e a adoção dessa forma de pagamento, mas sem prejudicar em nenhum momento a evolução do nosso crediário”, enfatizou Fulcherberguer ao EXAME IN. A participação do cartão nas lojas das Casas Bahia, como forma de pagamento, passou de 7% para 15,3%, na comparação da média em 2020 para a média do terceiro trimestre deste ano. Nas vendas online, esse percentual saiu de 3,1% para 5,7%, nesse intervalo. “Quando chegamos, o estoque do crediário estava em R$ 3,1 bilhões e agora está em R$ 5,7 bilhões”, completa Orivaldo Padilha, vice-presidente financeiro, no típico jogral da gestão da Via, lembrando a formação da equipe de gestão atual em 2019, após a pulverização do capital na B3.
“Todas as vezes que a solução de pagamento é própria, cartão emitido na casa ou crediário, a margem do cliente é maior”, gosta de lembrar Fulcherberguer. O serviço do CDC (crédito direto ao consumidor), que estava disponível para os clientes da Via em 36% dos municípios do Brasil, há um ano, agora está em 78%.
O executivo lista as diversas frentes de “ativos” que a companhia possui e como está “monetizando”. Ele deu destaque para os serviços de logísticas e até de soluções financeiras que são vendidas para parceiros comerciais, que estão no marketplace da Via ou até mesmo de mar completamente aberto. A plataforma de soluções financeiras da companhia já conta com 13 milhões de clientes, dentro e fora da Via. E aproveitou para chamar atenção como a empresa vem aumentando o estoque de operações em crédito pessoal. A companhia, que deu a largada a essa frente há cerca de um ano, acumula uma produção de R$ 440 milhões em crédito. A carteira ativa estava em R$ 243 milhões ao fim de setembro.
Dos R$ 3,25 bilhões do acordo com o Bradesco — valor que se pode concluir pelos documentos da empresa, divulgados como evento subsequente ao fechamento o terceiro trimestre —, R$ 1,5 bilhão dependem de a empresa cumprir algumas metas em relação ao potencial vislumbrado. Caso as metas sejam cumpridas, a empresa antecipa receita, em quatro tranches anuais, de pouco mais de R$ 350 milhões, pagas de 2024 a 2027.
“De qualquer forma, isso não é 100% do contrato”, ressalta Fulcherberguer, mas sem relevar o valor ou percentual. O executivo chamou atenção para o fato de a Via, além de ter entrado no segmento de crédito pessoal, também estar “vendendo” a solução de crediário, como motor, para outros varejistas, bem como os serviços logísticos. A diferença desses ativos em relação ao que ocorreu com a parceria com o Bradesco é o volume e a capacidade de monetizar antecipadamente o total, que dessa vez reforçaram — e não foi pouco — o caixa da companhia de imediato.
Os balanços do terceiro trimestre mostraram que o ambiente macroeconômico continua desafiador para o varejo. O valor total transacionado na plataforma da Via, o tal do GMV, caiu 7,6%, para R$ 10,23 bilhões. A receita líquida da empresa, porém, recuou menos, mostrando esforço de monetização dos serviços para os sellers: queda de 4,6%, para R$ 7 bilhões. O Ebitda, porém, fruto da desalavancagem operacional que a redução de receita implica, caiu 29%, para R$ 475 milhões. Americanas viveu desafio semelhante. Magalu trouxe um GMV de R$ 14 bilhões — praticamente a mesma cifra desde o segundo trimestre de 2021, com exceção do quarto trimestre do ano passado. Para completar, todas elas competem entre si.
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