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Governança

Tempero árabe: sem controle, Mubadala mira conselho do Burger King no Brasil

Fundo árabe estuda mesmo comprar participação relevante em gestora da rede Burger King no Brasil e ser minoritária influente

Burger King: cobiça do Mubadala por operação brasileira não passou (Eduardo Frazão/Exame)
Burger King: cobiça do Mubadala por operação brasileira não passou (Eduardo Frazão/Exame)
GV

Graziella Valenti

27 de setembro de 2022 às 17:40

A gestora Mubadala Capital, ao que tudo indica, ainda não se deu por vencida no caso da Zamp, que no Brasil é responsável pela gestão das franquias de fast food das bandeiras Burger King e Popeye’s e tem receita da ordem de R$ 3,5 bilhões por ano. A casa, que conta com recursos soberanos de Abu Dhabi e tem US$ 285 bilhões sob gestão em investimentos espalhados por 50 países, avalia como pode adquirir uma participação relevante na companhia, embora minoritária, e que possa render voz ativa no conselho de administração.

O 'plano A' da Mubadala era comprar o controle. A gestora adquiriu em bolsa pouco mais de 5% do capital e fez uma oferta pública (OPA) por 45% do capital, ao preço de R$ 8,31 por ação. O valor não despertou atenção dos investidores, mas o que matou a realização de um leilão na B3 foi a decisão da RBI, Restaurant Brands International, que é dona das marcas Burger King e Popeye’s.

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Após 50 dias de análise e uma diligência que pediu toda a cadeia de governança dos investimentos da Mubadala (incluindo como limited partner em gestões totalmente terceirizadas), a conclusão foi que há conflito de concorrência e que, por conta disso, os contratos de uso da marca para a Zamp poderiam ser cancelados.

Sem poder se tornar majoritária, a Mubadala quer ser, então, uma acionista relevante. O ativo já rendeu um bom dinheiro para a casa no passado, quando ficou com uma fatia que pertencia ao empresário carioca Eike Batista, durante a reestruturação da EBX. Os motivos de tanto interesse subitamente não estão claro. Não foi uma tese amplamente defendida para os investidores de mercado. E é parte da ansiedade dos investidores.

O fato de o ativo estar descontado é sabido. Mas para por aí, no óbvio. Como todas as companhias de alimentação fora do lar, a Zamp sofreu um bocado na pandemia e agora já mostra crescimento expressivo, superando inclusive o momento pré-covid. Só que na bolsa, essa recuperação ainda não veio. A companhia vale R$ 1,8 bilhão, pela cotação atual. Na oferta da Mubadala, a empresa foi avaliada em R$ 2,3 bilhões e, mesmo assim, o valor foi considerado baixo pelos acionistas, para convencê-los a entregar parte da posição.

Agora, essa capoeira entre Mubadala e RBI, meio dança, meio luta, está rendendo uma boa discussão nos bastidores e até mesmo casas renomadas do mercado, que sequer possuem posição em Zamp, estão de olho para entender o caso, acompanhar desdobramentos e aprender com seus precedentes.

O que tem despertado interesse é o fato de RBI ter dado a negativa para a Mubadala sem que o mercado tivesse conhecimento que ela poderia fazê-lo em casos de troca ou formação de controle, uma vez que a Zamp é uma companhia de capital pulverizado na B3. A empresa americana detém apenas 9,4% do capital da brasileira.

Os contratos da RBI com os franqueados não são públicos. E, até onde o EXAME IN apurou, o franqueado dono da loja não seria prejudicado em caso de alguma mudança para a Zamp — as consequências ficariam todas para a companhia listada na B3.

Até o momento, conforme fontes consultadas sobre o tema, nem mesmo a Mubadala compreendeu perfeitamente se a negativa que recebeu da RBI foi por ativos nos quais tem participação no controle ou se contaram para a decisão aqueles nos quais tem fatia minoritária relevante. A gestora tem outros ativos no mesmo setor de Burger King e Popeye’s na Ásia e nos Estados Unidos, mas nada no Brasil, onde os investimentos estão majoritariamente concentrados em utilidades públicas e infraestrutura.

Aqui do Brasil, pessoas próximas à Zamp afirmam que não há nenhum risco para a empresa no cenário em que a Mubadala compre papéis em bolsa, ainda que uma fatia relevante e sente no conselho de administração — inclusive com poderes sobre a gestão. O entendimento é que a RBI não poderia cancelar os contratos. Essa é a interpretação de pessoas próximas à companhia. Nas negociações internacionais e das quais a Zamp não participou, porém, não houve essa clareza.

Essa é também a preocupação de alguns investidores que têm maior exposição ao negócio e querem entender até onde vai o apetite da Mubadala e da RBI, inclusive para discussões. A Zamp é uma das maiores operações de Burger King fora dos Estados Unidos, com cerca de 900 lojas. Para a RBI seria uma situação complicada também.

Os investidores estão avaliando como a falta de informação sobre o impacto dos contratos da RBI afetam a Zamp. A Mubadala chamou os direitos da RBI de “pílula de veneno” escondida, fazendo referências às cláusulas de proteção à dispersão acionária que incluem uma espécie de barreira para quem quiser formar um bloco de influência relevante.

Aqui, porém, como não se trata de algo no estatuto da Zamp, os investidores querem entender melhor os acordos para saber o que esperar. A companhia brasileira avalia se será necessário trazer mais informações sobre os contratos da RBI ao mercado, mas até o momento não há nenhuma decisão a respeito, conforme o EXAME IN apurou.

Os poderes da RBI não estavam claros na época em que ocorreu a oferta pública inicial (IPO) da Zamp na B3, nem estão agora, no formulário de referência. Sabe-se que sob determinadas circunstâncias, a empresa americana pode declarar o fim dos acordos, mas não se sabe quais são elas. Nem se sabia que isso poderia ocorrer por uma mudança no controle da empresa.

Existem investidores que querem analisar se um movimento da Mubadala em bolsa, de formar um bloco relevante, poder ter alguma consequência sobre os contratos, mas não conseguem informações públicas sobre o assunto.

O EXAME IN apurou que a Mubadala não bateu o martelo sobre as compras, mas já estuda qual seria a melhor forma de fazer essa entrada maior na Zamp. Para fazer uma mudança mais brusca e imediata de gestão e garantir maioria em assembleia de acionistas, teria que adquirir algo em torno de 30% das ações. Como é um volume significativo, para adquirir no pregão normal, haveria um impacto no preço.

A outra possibilidade é aumentar gradualmente a posição até a assembleia geral ordinária de 2023 e não precisar encarar nenhum movimento mais agressivo, de destituição do conselho atual. Deixaria para eleger seus indicados no rito anual ordinário.

Apesar de muito burburinho, nada está claro de verdade. Nem se o Mubadala vai mesmo comprar essa briga potencial e fazer essa aquisição, nem como a RBI vai encarar o movimento e quais direitos possui pelos contratos. Já tem fundo consultando advogado para entender o enrosco potencial.

 

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