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Debêntures

Dívida: resgates de fundos em abril mantêm oportunidades de investimento

Nos dez primeiros dias, resgates em fundos de crédito somaram R$ 7 bi, ainda no ritmo dos choques de fevereiro e março

Crédito: títulos do setor se mantém atrativos, mas é necessário ser seletivo (Getty Images/Getty Images)
Crédito: títulos do setor se mantém atrativos, mas é necessário ser seletivo (Getty Images/Getty Images)
Karina Souza

Karina Souza

13 de abril de 2023 às 09:57

Os resgates em fundos de crédito continuam em patamares elevados em abril. Nos dez primeiros dias do mês, os saques somaram R$ 6,98 bilhões, de acordo com dados compilados pelo BTG Pactual (do mesmo grupo de controle da Exame), em uma análise que contempla fundos com pelo menos 50 cotistas e no mínimo R$ 50 milhões de patrimônio líquido. A cifra, sozinha, pode não dizer muita coisa, mas no contexto do que aconteceu nos três primeiros meses do ano, ajuda a entender melhor o impacto para o setor em 2023 -- e, consequentemente, as oportunidades que gera a partir de spreads maiores de títulos.

É uma história que começa em janeiro, quando a Americanas anunciou o rombo de R$ 20 bilhões no tal risco sacado. Os investidores, que já estavam de orelha em pé com o risco de calote da varejista, foram surpreendidos no fim do mês pela reestruturação financeira da Light, de olho em melhorias em sua estrutura de capital. O efeito combinado foi de uma explosão de saques em fundos de crédito privado. Dados compilados pelo BTG Pactual (do mesmo grupo de controle da Exame) sob os mesmos critérios mostram que os resgates somaram R$ 5,23 bilhões em janeiro, cifra que multiplicou por quatro em fevereiro, com resgates de R$ 21,83 bilhões.  

Com tantos resgates ao mesmo tempo, fundos desse segmento tiveram de vender títulos no mercado — a fim de devolver o dinheiro para os cotistas, afinal. Com todas as operações acontecendo ao mesmo tempo, o spread dos prêmios abriu. E chegou até mesmo aos setores mais resilientes da economia, como utilities. Um relatório, também do BTG Pactual, mostrou que o prêmio das debêntures isentas de transmissão de energia, que tinha uma diferença de 0,90 pontos-base ante a NTN-B antes do episódio Americanas, chegou a uma diferença de 150 pontos-base em março deste ano. 

De acordo com a Teva, que faz índices para o mercado de ETFs, ao compilar dados de janeiro a abril, o principal fator responsável pelo aumento dos prêmios no período foi justamente o anúncio da reestruturação da Light. Por dia, a empresa gerou um incremento de 0,0016 ponto percentual nos spreads dos ativos, ante 0,0013 gerados a partir da Americanas. 

Depois de toda essa turbulência no primeiro bimestre, a perspectiva de fontes ouvidas pelo EXAME IN em março era a de que este seria um mês mais tranquilo do que o anterior em termos de resgates, o que consequentemente faria os spreads crescerem a um ritmo menor. Parte dela, ao menos, pôde ser confirmada: os resgates dos fundos, ainda na análise do BTG Pactual e sob os critérios estabelecidos, caíram de R$ 21,83 bilhões em fevereiro para R$ 19,96 milhões em março. 

Contudo, o cenário não é o de uma queda contínua. Afinal, nos 10 primeiros dias de abril, o fluxo somou R$ 6,98 bilhões, um número longe de ser irrelevante. Em um exercício de extrapolação, mantida essa mesma proporção pelo restante do mês, abril geraria um fluxo de resgates acima do registrado no mês anterior. Considerando o anúncio recente da Light de busca de proteção judicial, ainda não é possível saber com certeza qual será o impacto desse novo anúncio da companhia no mercado. 

Uma fonte ouvida pelo EXAME IN aponta que, agora, a percepção predominante é a de que os riscos já estão precificados. “Já houve uma marcação a mercado para refletir a nova realidade e, portanto, o evento que acontecer agora vai ser mais residual, não deve acontecer na mesma proporção do que se viu em janeiro e fevereiro”, diz. 

Enquanto a situação não se estabiliza, gestores que atuam no mercado de crédito estão indo às compras — mas de forma moderada, é claro. O discurso é o de que, antes de qualquer coisa, os ativos têm de ser high grade. Nesse caminho, Fernando Marinho, sócio da Valora Investimentos, gestora especializada em renda fixa e crédito privado com R$ 11 bilhões sob gestão, afirma que a empresa está atenta às oportunidades. 

“Ao mesmo tempo que uma empresa de um setor mais defensivo tinha um prêmio de CDI+1%, que foi para CDI+2% e agora está em CDI+1,75%, tem empresas no ‘tier dois’ que estão a CDI+6% e CDI+10%, mas que ainda são sólidas e têm muita coisa refletida no preço. É razoável que, na média, o valor esperado seja bom”, afirma, ao EXAME IN.

Daqui para frente, as expectativas são positivas, mesmo em meio a um cenário sabidamente pior para as emissões primárias -- com os juros altos mais uma vez desempenhando seu papel. Soma-se a isso outro fator, o de antecipação de dívidas para captações feitas em 2022, ano eleitoral e já de perspectivas de juros altos por tempo prolongado. Dados da Anbima mostram que as emissões de debêntures somaram R$ 271 bilhões, alta de 8,2% em relação a 2021. "Se as emissões deste ano ficarem em 60% a 70% do que foi o ano passado, vou considerar excelente", diz Marinho.

Em meio a um cenário de juros altos, o crédito privado tem se tornado cada vez mais interessante. O EXAME IN detalhou, também nesta semana, como a alocação da indústria de fundos mudou, mais orientada à dívida. Em resumo, a relação do total de recursos investidos em dívida de companhias e o total em ações passou de 68% para 72% entre o fim do ano passado e fevereiro deste ano. Hoje, R$ 377 bilhões (dos quase R$ 6 trilhões de toda a indústria) estão alocados em debêntures.

Num mercado que se torna cada vez maior, diante dos problemas enfrentados recentemente por grandes empresas, o aumento da preocupação sobre o risco contratado é uma consequência natural. Light e Americanas trouxeram o susto para o investidor de fundos de crédito, mas, em tempos tão dinâmicos (e tão desafiadores) a certeza é a de que os olhares permanecerão atentos.

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Karina Souza

Karina Souza

Repórter Exame IN

Formada pela Universidade Anhembi Morumbi e pós-graduada pela Saint Paul, é repórter do Exame IN desde abril de 2022 e está na Exame desde 2020. Antes disso, passou por grandes agências de comunicação.