Como a Multiplan saiu de "patinho feio" na pandemia para um trimestre marcado por recordes
Investimento alto e endividamento baixo trazem diferencial à companhia em meio ao ambiente de incertezas no varejo
Karina Souza
Repórter Exame IN
Publicado em 30 de abril de 2023 às 15:34.
Os shoppings voltaram com tudo — pelo menos, para a Multiplan. A pandemia e os efeitos do isolamento social são um passado distante para a empresa, que, neste primeiro trimestre, surpreendeu (positivamente) os analistas, com resultados acima do esperado pelo Itaú BBA e pelo Goldman Sachs. Um olhar sobre os dados permite encontrar uma combinação rara neste período de juros altos e incertezas sobre o varejo: capacidade de investir, endividamento baixo e crescimento.
Colocando os números nos conceitos, a empresa tem os níveis de alavancagem mais baixos dos últimos dez anos, com o indicador dívida líquida/Ebitda em 1,53 vez. Isso em um período no qual investiu de forma maciça: nos primeiros três meses de 2023, a cifra foi maior do que a de todo o ano de 2022 (R$ 216 milhões ante R$ 194 milhões).
“Em tempos de juros mais altos, manter a alavancagem baixa é fundamental. Estamos bem distantes do nosso covenant, de quatro vezes dívida líquida/Ebitda, e queremos nos manter assim, para ter a capacidade de aproveitar oportunidades que façam sentido”, afirmou Armando d’Almeida Neto, VP financeiro e de Relações com Investidores, no call realizado na última semana.
Ainda de acordo com o executivo, três fatores são analisados para viabilizar essa estratégia de expansão. O primeiro é mais operacional, de aquisição, expansão ou revitalização de portfólio — o foco principal do montante aplicado nestes primeiros três meses de 2023. No detalhe, o trimestre foi marcado pela aquisição de 24,95% do Diamond Mall e por revitalizações e melhorias em outros três shoppings, além de expansões em mais um. Os outros dois fatores de investimento da Multiplan são financeiros. E seguem na mira da companhia para o ano: fornecer retorno atrativo para os investidores e recomprar ações.
Focando no que fez a diferença neste início de ano, ter uma estrutura física revitalizada (além de investir no app da rede, que já conta com quatro milhões de usuários) foi a catapulta para a companhia conseguir realizar mais eventos em seus empreendimentos, o que, por sua vez, retroalimentou as vendas de lojistas. Nos primeiros três meses do ano, foram realizados 257 eventos nos shoppings, um recorde para o período. “É uma forma de responder à adversidade. E temos mais planos para o restante do ano”, afirmou Eduardo Peres, CEO da Multiplan, no call.
Mais do que trazer tráfego, os eventos e os investimentos —- tanto em infraestrutura quanto em modificação do mix de lojas —- resultaram em vendas. De janeiro a março, a Multiplan apontou vendas de lojistas de R$ 4,6 bilhões, o melhor resultado para um primeiro trimestre, como apontou o Itaú BBA . Para abril, as perspectivas continuam otimistas, ainda que estejam mais próximas de um ambiente de normalização do que de recorde.
De acordo com as informações divulgadas no call, as vendas no quarto mês do ano cresceram 6% em relação ao mesmo período do ano passado. Lembrando que, em 2022, o aumento de vendas foi de 29% em relação ao período pré-pandemia (2019), o que forma uma forte base de comparação. A modificação proativa do mix de lojas continua: foram 115 novos contratos no primeiro trimestre, número que já subiu para 170 até abril.
Com mais vendas, o outro lado -- o dos lojistas -- foi de um custo de ocupação menor. O indicador caiu 0,6 ponto percentual na comparação com o mesmo período do ano passado, fechando o período em 15%. Apesar de a taxa ainda estar acima da registrada em 2019, o analista Jorel Guilloty, do Goldman Sachs, afirma que essa é uma dinâmica sustentável, principalmente olhando para os shoppings de alto padrão da companhia, os principais responsáveis por conseguirem equilibrar o aumento de custos com ganhos maiores, diante de uma oferta a um público consumidor com maior poder de compra.
Como tudo apareceu no balanço da Multiplan
Juntando todos esses fatores, fica fácil de entender por que a receita total de locação da companhia aumentou 8,8% em relação ao mesmo período do ano passado, atingindo R$ 384,4 milhões, recorde para um primeiro trimestre e o terceiro maior valor da história da companhia, incluindo os quartos trimestres. A receita líquida ficou em R$ 471,5 milhões, aumento de 12,3% em relação ao mesmo período do ano passado e acima das expectativas de analistas. O aumento veio mesmo com uma queda na receita de venda de imóveis, de 65,1%, refletindo o momento macroeconômico adverso para o crédito, especialmente dentro do projeto residencial Golden Lake.
Como reflexo da retomada da vida presencial, a empresa também registrou despesas menores, refletindo principalmente a melhora dos índices de inadimplência. A taxa ficou em 3,2%, abaixo dos 5% registrados no mesmo período do ano passado e mais próxima dos 2,4% do primeiro trimestre de 2019.
O resultado operacional líquido (NOI) também veio com recorde para um primeiro trimestre: R$ 402,7 milhões, 17,6% acima do registrado no mesmo período do ano passado. A margem também aumentou, para 89,8%. O principal fator a contribuir para os indicadores de rentabilidade tem a ver com o desempenho dos shoppings de alto padrão (AAA/A) do portfólio da companhia. Segundo o Goldman Sachs, eles são responsáveis por 75% do NOI, o que ajudou a trazer um crescimento nominal de 9% no aluguel por metro quadrado, com uma inflação de 5%.
O Ebitda da empresa, de R$357 milhões, aumento de 21,1% na comparação anual e recorde para um primeiro trimestre, com margem maior: passou de 70,3% para 75,9%. A geração de caixa, impulsionada pelo aumento nas receitas de locação, contribuiu para a redução na alavancagem da companhia -- em meio ao aumento de investimentos.
O lucro líquido foi de R$ 207,2 milhões, aumento de 20,8% na comparação anual. De olho em ressaltar a geração de valor ao longo do tempo, os porta-vozes da companhia afirmaram, no call, que, desde o IPO em 2007, a última linha do balanço aumentou 20 vezes.
Em um trimestre de recordes, a companhia ainda aponta um relevante potencial de expansão: 693 mil metros quadrados de terrenos para futuros projetos. Todas as áreas estão integradas aos shoppings e devem ser utilizadas para “o desenvolvimento de projetos multiuso”, de acordo com o balanço. Além disso, a companhia estima um potencial de crescimento da ABL de 200 mil metros quadrados em expansão dos shoppings — dos quais 18 mil metros quadrados já estão em obras.
Ainda que não seja possível prever o futuro -- especialmente em um ambiente recheado de incertezas, como o atual -- a Multiplan mostrou que consegue se recuperar do baque da pandemia. De olho no ‘shopping do futuro’, que mistura experiências com compras, e com um olhar atento para os próprios ativos, a companhia conquistou resultados relevantes em um início de ano desafiador. O desenrolar da situação macroeconômica do país desperta curiosidade para entender como a companhia vai continuar mantendo os padrões de resultados altos ao longo de 2023.
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Karina Souza
Repórter Exame INFormada pela Universidade Anhembi Morumbi e pós-graduada pela Saint Paul, é repórter do Exame IN desde abril de 2022 e está na Exame desde 2020. Antes disso, passou por grandes agências de comunicação.