24 de junho de 2024 às 15:22
Angela Davis, filósofa e professora americana, é como uma estrela de rock do ativismo pelos direitos humanos e do movimento negro. Na última semana, esteve no Brasil para participar do Festival Led – Luz na Educação, promovido pela Globo, e falou com a EXAME.
“Conhecimento é o oposto da escravidão. Eu cresci em uma família de professores, em uma das cidades mais segregadas dos Estados Unidos. Isso significa que eu costumava ter muita raiva com o fato de os negros não poderem entrar em espaços como as bibliotecas", contou.
Davis citou como é preciso enxergar a educação em espaços nos quais ela parece não ocorrer, como nas prisões. “Penso que as escolas podem aprender sobre como pessoas presas podem ser educadas e perceber na educação uma chave para a mudança", disse.
A ativista ficou atônita ao saber, no palco, que o livro "O Menino Marrom", obra de Ziraldo publicada em 1986, que conta a história de dois meninos – um negro e um branco – foi suspenso de escolas municipais da região de Conselheiro Lafaiete, em Minas Gerais.
“Eu não consigo acreditar que os livros ainda são considerados maus no Brasil. Enquanto tantos se esforçam para avançar em um futuro sem racismo, exploração de classe, homofobia e medo das mudanças climáticas, outros usam livros para voltar a história em períodos inadmissíveis".
No palco, Davis não deixou de agradecer aos professores. "Aos 80 anos, continuo fazendo o que faço porque essa é a minha vida. Ensinar me traz o aprendizado contínuo. A educação é a forma de buscar a inclusão de grupos que são tão excluídos, como negros e indígenas", afirmou.
Durante happy hour com jornalistas, ela buscou entender o andamento do caso Marielle Franco, vereadora do Rio de Janeiro assassinada em 2018. “Eu vi que há novidades sobre a apuração do caso. Os assassinos estão presos? Eles estão no poder?”, perguntou preocupada.
Davis vê avanços desde a sua última vez no Brasil. “Falei sobre a falta de conhecimento de grande parte dos brasileiros pelas ativistas negras do país, como Lélia Gonzalez. Vejo muito mais engajamento nos livros de feministas negras brasileiras agora", contou.
Davis citou a questão do aborto, tendo conhecimento do Projeto de Lei 1904, que visa alterar o Código Penal para equiparar o aborto ao homicídio. "Claro que devemos lutar por direitos reprodutivos e o fim da criminalização das decisões das mulheres", conta.
Ela entende que as grandes manifestações não precisam ser diárias: "Estamos falando educar as pessoas para que elas descubram como exercer o ativismo a partir de uma consciência coletiva. É nos períodos aparentemente quietos que acontece a maior parte do trabalho de revolução".