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Raphael Montes celebra protagonismo na literatura de horror - e agora quer apostar mais no streaming

Antes de sua participação na Bienal do Livro, o autor de "Uma Família Feliz" e roteirista de "Bom Dia, Verônica" conta à EXAME sua trajetória e os desafios de ser um escritor no Brasil

Raphael Montes, autor do livro "Uma Família Feliz" e da série "Bom Dia, Verônica" (Divulgação/Divulgação)

Raphael Montes, autor do livro "Uma Família Feliz" e da série "Bom Dia, Verônica" (Divulgação/Divulgação)

Mateus Omena
Mateus Omena

Repórter da Home

Publicado em 7 de setembro de 2024 às 12h00.

Última atualização em 7 de setembro de 2024 às 12h57.

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Com 12 anos de carreira na literatura, Raphael Montes provou seu domínio na arte de criar história perturbadoras e personagens cativantes. O escritor e roteirista desembarca em São Paulo neste fim de semana para participar da 27ª Bienal Internacional do Livro como uma das principais atrações desta feira.

O carioca de 33 anos é uma das figuras em ascensão na literatura contemporânea, conhecido por obras de suspense policial que conquistaram o público e incentivaram sua entrada no cinema e no streaming.

Raphael Montes começou a sacudir o universo da ficção em 2012, quando lançou seu primeiro livro "Suicidas", num período em que os suspenses policiais não eram tão populares no Brasil. Desde então, publicou mais sete romances e se consolidou entre os autores mais lidos do país, sempre explorando tramas criminais.

Na TV, Raphael trabalhou como roteirista em séries como "Romance Policial – Espinosa", do GNT, e "Bom Dia, Verônica", da Netflix. Ele também escreveu roteiros de filmes, como a trilogia "A Menina que Matou os Pais", que retrata os crimes de Suzane von Richthofen e os irmãos Cravinhos, exibida no Prime Video.

As criações de Raphael Montes ajudaram a dar um "gás" no gênero de suspense policial no Brasil, que se beneficia do crescente interesse por títulos locais.

Em abril, o escritor celebrou a estreia de "Uma Família Feliz" nos cinemas brasileiros, que marcou um novo capítulo em sua carreira. Além de escrever o livro que inspirou o filme — lançado cerca de um mês antes —, Montes também foi roteirista e diretor-assistente na produção cinematográfica.

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Em entrevista à EXAME, Raphael Montes comenta sobre seus recentes trabalhos na literatura, inspirações e curiosidades de sua vida que não estão nas páginas dos livros. Confira a seguir:

Como surgiu sua paixão pela literatura de gênero, especialmente mistério e suspense?

Eu fui uma criança criada em uma casa com poucos livros. Meus pais nunca gostaram de ler. Minha tia-avó foi a responsável por me introduzir à leitura, quando me presenteou com o primeiro livro que li na vida, "Um Estudo em Vermelho", de Sir Arthur Conan Doyle, a primeira aventura de Sherlock Homes. A partir disso, eu comecei a mergulhar em vários livros desse autor, além de outros famosos do gênero policial como Agatha Christi e Sidney Sheldon. Também comecei a devorar muitos misterios da literatura juvenil brasileira, de autores como Pedro Bandeira.

Foi esse prazer que te motivou a escrever seus próprios livros e apostar em tramas de suspense?

Com certeza! Eu comecei a escrever minhas primeiras histórias aos 10 anos de idade, nos cadernos escolares. Também tinha o costume de contá-las para os meus amigos e colegas de turma. Na época eu já me sentia a própria Sherazade de "As Mil e Uma Noites", por instigar os leitores com surpresas e viradas ao longo da história. A paixão pela leitura e a vontade de escrever surgiram justamente no gênero policial. Comecei a escrever contos nesse universo. Às vezes eu penso que se eu tivesse começado a gostar de ler por meio do gênero fantasia ou ficção científica, talvez eu seria um escritor diferente hoje.

Eu lembro que quando comecei a escrever literatura policial, muitos editores me desmotivaram, porque insistiam: "A literatura brasileira contemporânea não vende e o gênero policial não é a melhor opção". Mas a verdade é que naquele momento eu estava ingressando em um nicho que nenhum escritor estava investindo. Também não havia espaço para esse tipo de literatura nas feiras e nas gôndolas das livrarias.

O que justifica o crescimento desse gênero no Brasil? 

Existe um movimento forte de valorização da literatura brasileira contemporânea. Eu testemunho isso desde o início da minha carreira. A meu ver, essa onda foi puxada pelos booktubers, booktokers e pessoas que fazem resenhas de livros nas redes sociais. Claro que os livreiros e os eventos do setor tiveram grande relevância para essa virada. Mas, é necessário reconhecer que os influenciadores digitais contribuíram para que as pessoas enxergassem o valor da literatura brasileira contemporânea.

De que maneira essa 'onda' te favoreceu?

Meus livros cresceram muito também no boca-a-boca, bem no momento em que as pessoas estão reconhecendo que a literatura brasileira pode ser profunda, poética, provocadora e muito gostosa para consumir. As pessoas estão dando mais chance para os autores contemporâneos. Elas pararam para pensar que não faz sentido dedicar mais atenção às narrativas estrangeiras e não olhar para aquelas que falam da nossa cultura e do nosso país. Vários gêneros estão sendo beneficiados. Na lista de autores mais vendidos, destacam-se importantes nomes como Carla Madeira e Thalita Rebouças.

Basta olhar para a composição da Bienal do Livro deste ano, que está direcionando os autores brasileiros às arenas principais. Anos atrás, e até na minha infância, esses espaços de prestígio eram reservados apenas para autores estrangeiros, que atraíam os compradores de ingressos. Agora, testemunhamos o movimento inverso.

Esse estilo de literatura traz uma nova perspectiva sobre os problemas do Brasil, muitos deles ignorados pela sociedade?

A literatura funciona com elementos muito específicos. O gênero policial trabalha com a violência, enquanto terror usa o medo. Já a ficção científica se agarra às distopias para criar uma realidade paralela. Em qualquer cenário, é possível fazer um debate sobre a realidade. Os aspectos sociais, críticos e políticos da literatura de gênero começaram a ficar mais evidentes para o público no cinema.

Se pensarmos, por exemplo, em "Corra" [filme do diretor Jordan Peele], há abordagem do racismo de uma maneira tão profunda que, talvez, um longa político e realista sobre esse tema não teria o mesmo alcance. Já a série "The Handmaid's Tale" [criada pela escritora Margaret Atwood], que começou como um livro, descreve uma realidade distópica a partir do machismo.

Quando eu começo a contar uma história de violência, suspense ou crime para os leitores, tenho que pensar: essa ação é crime em que sociedade? para os brasileiros, quem é a vítima e o criminoso? na vida real, quem é punido? como a justiça funciona? faz diferença ser rico ou pobre, branco ou preto, hétero ou gay, homem e mulher? Todos os esses fatores determinam as minhas narrativas.

Eu acho que na literatura, é possível criar um vínculo emocional com quem está lendo e criar discussão sobre assuntos que são muito pertinentes, provocativos e muito contemporâneos. É algo que eu busco de propósito. Em "Uma Família Feliz", meu livro mais recente, trago um debate sobre as pressões sociais da maternidade e o papel da mulher numa sociedade de aparências. Há críticas também a respeito da cultura do cancelamento e de uma classe média alta que se compara à elite. Nas três temporadas de "Bom Dia, Verônica", a discussão gira em torno da violência contra a mulher. "Jantar Secreto" é um livro absolutamente social e político, com uma história muito forte.

Como ocorreu a adaptação do livro "Uma Família Feliz" para o cinema?

É algo bem curioso. Na verdade, eu escrevi primeiro o roteiro para o filme e após as filmagens foi feita uma adaptação. Quando o longa estava em produção, eu tive a ideia de escrever o livro abordando aspectos e possibilidades que normalmente o cinema não mostra. Foi a primeira vez em que eu fiz o contrário. Honestamente, o processo foi delicioso, porque após escrever tantas escalas para o audiovisual, respeitando as limitações sobre o que vai ou não para as telas, no livro foi possível encontrar mais liberdade. É um lugar onde a critividade é ilimitada e posso descrever as complexidades dos personagens, entrar na cabeça deles. Para mim, a parte engraçada de fazer uma adaptação da literatura para o cinema é que, mesmo que esses mundos sejam diferentes, eles podem ser complementares.

Você também está trabalhando em "Beleza Fatal", a primeira novela do Max, e na série "Dias Perfeitos", para o Globoplay. O que você pode nos adiantar sobre essas produções?

A série "Dias Perfeitos" já está pronta e será lançada no próximo ano. Mas, ainda não foi definida a data que a produção vai entrar no catálogo do Globoplay. "Beleza Fatal" também é outro projeto muito importante para mim. É a primeira novela do Max, que vai estrear em janeiro de 2025. Ela conta com todos os elementos de melodrama, com romance e conflitos. Além de segredos de família. Como a obra foi escrita por mim, também terá humor ácido, suspense, momentos de virada e muitos plot twists para deixar a história mais ágil. Gosto de considerá-la um híbrido, porque é uma novela com elementos de série.

Quais os maiores desafios para quem quer ser um escritor no Brasil atualmente?

A primeira dificuldade que um escritor enfrenta é conseguir ser publicado. Quando comecei foi muito difícil entrar no mercado literário, levei muitos "nãos". Depois que se entra nesse setor e começa a publicar, o problema é chegar no leitor. Foi uma barreira que eu levei alguns anos para superar.

Hoje, acredito que outro grande desafio para quem quer ser escritor é estar sempre atento ao que acontece no mundo, que está sempre em transformação, porque sempre chega uma nova tecnologia ou uma nova tendência cultural. Mas, diante de tudo isso, é necessário manter a sua integridade narrativa. É muito fácil se deixar levar por "ondas" ou pelo que você acha que vai dar certo. Acho que o maior teste é se manter fiel a quem você é.

Essa fórmula deu certo para mim. Costumo ouvir das pessoas que meus livros tiraram elas da ressaca literária ou devolveram o prazer pela leitura. Na verdade, aprendi a criar histórias que são muito engajantes, com muitas viradas. Quero sempre pegar o leitor pela mão e levá-lo comigo em minhas aventuras.

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