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Empreendedor pode se aposentar?

Muita gente acha natural um atleta de 34 anos parar de jogar futebol — mas condena o empreendedor de 60 que decide se recolher

Será que não temos o direito de ficar sossegados numa poltrona? (Stock.xchng)
DR

Da Redação

Publicado em 3 de agosto de 2011 às 09h00.

Comecei a ser empresário aos 17 anos vendendo adesivos para enfeitar motocicletas. Na época, dizia que me aposentaria aos 42 — por competência ou por incompetência. Estou com 39 anos e, faltando três para chegar lá, tenho pensado nisso de outro ponto de vista: será que empreendedor pode se aposentar?

Muita gente diz que não. Que quem fez essa opção aceitou uma abnegação que proíbe passar os últimos anos de vida em cruzeiros pelo mundo, ter tempo sobrando para ler um jornal ou simplesmente não fazer nada, esparramado na poltrona de chinelo e pijama. Dizem que é porque assumimos compromissos com clientes e fornecedores e seria muito feio deixá-los na mão.

Confesso que eu também, quando sei que Fulano deixou o negócio para passear e frequentar restaurantes, tendo a julgá-lo mal. Parece-me um absurdo desistir de algo que exigiu tantos sacrifícios. E os funcionários? Coitados, foram abandonados no barco. Mas, depois, penso melhor.

Então empreendedor também não é um ser humano que, num certo ponto da vida, tem vontade de descansar?

As pessoas acham natural que, aos 34 anos, Ronaldo anuncie sua retirada dos campos, depois de uma série de contusões. Mas condenam um empreendedor que, aos 60, quer se recolher. Agora, pense no tipo de contusão que ele colecionou. Pense nas vezes em que, mesmo gripado, precisou comparecer numa negociação importante.


Nos finais de semana em que não foi possível ficar com a família para honrar o prazo combinado com um cliente. Na ginástica que nunca deu para fazer por causa da agenda perturbada por imprevistos.

Se não nos aposentamos, a vida, cedo ou tarde, aposenta a gente. E não dá para ter certeza de que alguém continuará alimentando meu sonho. Outro dia, me perguntaram para quem deixaria a empresa. Respondi que não deixaria para ninguém.

Minha filha Anna tem 5 anos. A mais velha, Isabella, tem 12. E se elas não tiverem aptidão ou interesse para os negócios? Empresa não é seguro de vida.

Na origem de toda essa reflexão está a noção de que uma empresa deve durar mais do que quem a criou. Construir uma empresa saudável o bastante para durar enquanto você existir já não é o bastante?

Desconfio que muitos empreendedores também acham isso. O mundo está cheio de gente que abriu um negócio para ganhar dinheiro e depois descansar. Algo errado nisso? Eu acho que não.

Se lá no começo tivessem me avisado das dores de ser empreendedor, teria pensado melhor — e feito tudo exa­tamente como fiz. Amo retornar ao trabalho às segundas-feiras. Amo os problemas da empresa, pois tenho capacidade de solucioná-los. Amo o risco, o sobe e desce de dirigir nessa estrada, porque detesto vias planas com paisagem sempre igual.

Amo ser empreendedor, sim. Mas vou me aposentar, embora não mais aos 42. Vou esticar e me aposentar aos 82 — por competência ou por incompetência.

Comecei a ser empresário aos 17 anos vendendo adesivos para enfeitar motocicletas. Na época, dizia que me aposentaria aos 42 — por competência ou por incompetência. Estou com 39 anos e, faltando três para chegar lá, tenho pensado nisso de outro ponto de vista: será que empreendedor pode se aposentar?

Muita gente diz que não. Que quem fez essa opção aceitou uma abnegação que proíbe passar os últimos anos de vida em cruzeiros pelo mundo, ter tempo sobrando para ler um jornal ou simplesmente não fazer nada, esparramado na poltrona de chinelo e pijama. Dizem que é porque assumimos compromissos com clientes e fornecedores e seria muito feio deixá-los na mão.

Confesso que eu também, quando sei que Fulano deixou o negócio para passear e frequentar restaurantes, tendo a julgá-lo mal. Parece-me um absurdo desistir de algo que exigiu tantos sacrifícios. E os funcionários? Coitados, foram abandonados no barco. Mas, depois, penso melhor.

Então empreendedor também não é um ser humano que, num certo ponto da vida, tem vontade de descansar?

As pessoas acham natural que, aos 34 anos, Ronaldo anuncie sua retirada dos campos, depois de uma série de contusões. Mas condenam um empreendedor que, aos 60, quer se recolher. Agora, pense no tipo de contusão que ele colecionou. Pense nas vezes em que, mesmo gripado, precisou comparecer numa negociação importante.


Nos finais de semana em que não foi possível ficar com a família para honrar o prazo combinado com um cliente. Na ginástica que nunca deu para fazer por causa da agenda perturbada por imprevistos.

Se não nos aposentamos, a vida, cedo ou tarde, aposenta a gente. E não dá para ter certeza de que alguém continuará alimentando meu sonho. Outro dia, me perguntaram para quem deixaria a empresa. Respondi que não deixaria para ninguém.

Minha filha Anna tem 5 anos. A mais velha, Isabella, tem 12. E se elas não tiverem aptidão ou interesse para os negócios? Empresa não é seguro de vida.

Na origem de toda essa reflexão está a noção de que uma empresa deve durar mais do que quem a criou. Construir uma empresa saudável o bastante para durar enquanto você existir já não é o bastante?

Desconfio que muitos empreendedores também acham isso. O mundo está cheio de gente que abriu um negócio para ganhar dinheiro e depois descansar. Algo errado nisso? Eu acho que não.

Se lá no começo tivessem me avisado das dores de ser empreendedor, teria pensado melhor — e feito tudo exa­tamente como fiz. Amo retornar ao trabalho às segundas-feiras. Amo os problemas da empresa, pois tenho capacidade de solucioná-los. Amo o risco, o sobe e desce de dirigir nessa estrada, porque detesto vias planas com paisagem sempre igual.

Amo ser empreendedor, sim. Mas vou me aposentar, embora não mais aos 42. Vou esticar e me aposentar aos 82 — por competência ou por incompetência.

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