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'Comprar vida ou morrer esperando', Chile decide se garante direito à saúde

Pessoas se manifestam contra a aprovação da nova Constituição do Chile em Santiago, em 30 de agosto de 2022

O sistema de saúde no Chile nasceu com a atual Constituição de 1980, herdada da ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990) (MARTIN BERNETTI/Getty Images)

O sistema de saúde no Chile nasceu com a atual Constituição de 1980, herdada da ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990) (MARTIN BERNETTI/Getty Images)

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AFP

Publicado em 31 de agosto de 2022 às 12h00.

Última atualização em 31 de agosto de 2022 às 14h36.

"Se você tem dinheiro, você compra saúde. Se não, morre esperando", afirma Alejandra Pérez, paciente de câncer de mama que lutou como constituinte para garantir no Chile o direito à saúde na nova Constituição.

Em um país onde mais de 80% dos quase 20 milhões de habitantes busca atendimento no sistema público, prejudicado pela falta de recursos, "adoecer no Chile é a ruína econômica; em muitos casos é a morte", assinala Pérez à AFP.

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Ela diz que "compra vida" no sistema privado para se tratar do câncer e evitar as intermináveis listas de espera e emergências colapsadas da saúde pública. "Se você tem dinheiro, você tem saúde", afirma.

O sistema de saúde no Chile nasceu com a atual Constituição de 1980, herdada da ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990), que garante "acesso livre e igualitário às ações de promoção, proteção e recuperação da saúde", mas não o direito à saúde como tal.

A proposta de Constituição elaborada durante um ano por 154 constituintes, eleitos pelo voto popular de forma paritária, reconhece em seu artigo 44 que "toda pessoa tem direito à saúde e ao bem-estar integral, incluindo suas dimensões física e mental".

Mais de 15 milhões de pessoas estão registradas para votar no domingo sobre a nova Carta Magna. A possibilidade de "rejeição" lidera todas as pesquisas, com até 56% de apoio.

Sistema integrado

O atual sistema de saúde do Chile está dividido entre atenção pública e privada. A proposta de Carta Magna propõe um sistema "de caráter universal, público e integrado".

Atualmente, a saúde é financiada por meio do aporte obrigatório de 7% do salário do trabalhador, que decide se o dinheiro vai para o sistema público (Fundo Nacional de Saúde, Fonasa), que também inclui aqueles que não aportam recursos, ou para o sistema privado, cujas companhias são chamadas de Isapres.

Cerca de 16% da população utiliza os Isapres, que recebem em troca a bonificação de aproximadamente 60% de suas prestações de saúde, e diferenciam seus afiliados por idade e sexo.

A proposta estabelece que todos os aportes serão destinados ao sistema unificado e haverá a opção de um plano de saúde privado complementar, mas não alternativo como acontece agora.

O objetivo é fortalecer um sistema universal e evitar "que finalmente [apenas] quem tem dinheiro no bolso possa pagar o atendimento", diz à AFP a médica Francisca Crispi, presidente do Colégio Médico (Colmed) de Santiago.

Distribuição de recursos

A falta de aportes se traduz em uma redução do poderio econômico para financiar as necessidades do sistema público, que recebe 71% de seu orçamento através de recursos do Estado e apenas 21% por meio dos aportes impositivos.

"Mais gente busca atendimento no setor público, que é onde entra menos dinheiro. Entra mais dinheiro no setor privado, que atende menos gente, por isso oferece um atendimento melhor", indica Pérez.

As salas de emergência nos hospitais públicos lotam diariamente, com tempo de espera superior a seis horas e, para alguns tratamentos e operações, a espera chega a superar os 500 dias.

Os centros cirúrgicos públicos muitas vezes fecham às 13h00, alega Crispi. "Temos muito a melhorar e fortalecer na gestão do sistema público para conseguir otimizar a capacidade", acrescentou.

Dúvidas

Na Associação de Isapres, que reúne os seis planos de saúde privados que existem no Chile, as mudanças propostas pela nova Carta Magna geram preocupação.

Os planos não consideram que o modelo integrado "será um avanço", porque "vai sobrecarregar o sistema público", comenta à AFP Gonzalo Simón, presidente da Associação de Isapres.

"Caso esta nova Constituição entre em vigor e este sistema seja colocado em prática, perde-se a possibilidade de escolha e todas as pessoas terão que ser transferidas forçadamente para a opção pública", ressalta.

Contudo, os médicos do Colmed alegam que a capacidade de decisão nunca foi universal.

"Essa liberdade de escolha é parcial e para poucos. É para o percentual [da população] que pode pagar um plano de saúde", afirma Crispi.

"Sinto que nós nunca tivemos direito [à saúde] e não sabemos como funciona nem como reivindicar. É algo que está chegando agora", destaca Pérez, com a esperança de que, com uma nova Constituição, pacientes como ela poderão receber tratamento sem que tenham que perder sua casa ou se endividar por 20 anos.

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