"Banco Central já poderia estar cortando a Selic", diz economista-chefe do Banco Inter
Para Rafaela Vitória, queda da inflação já justificaria o BC começar a cortar juros na próxima reunião
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Rafaela Vitória, economista-chefe do Inter (Inter/Divulgação)

Publicado em 9 de junho de 2023 às, 06h20.
Última atualização em 9 de junho de 2023 às, 08h12.
Dados da economia brasileira seguem superando positivamente as expectativas do mercado financeiro. Nesta semana, a surpresa veio do Índice de Preço ao Consumidor Amplo (IPCA), que saiu abaixo do esperado para o mês de maio. Foi a primeira vez desde 2020 que o principal indicador da inflação local caiu para abaixo de 4% na comparação anual, ficando em 3,94%. A projeção mediana era de queda de 4,18% para 4,04% frente ao mês anterior.
Com a inflação se dirigindo à meta de 3,25% para este ano e de 3% para 2024, crescem as pressões para que o Banco Central inicie o ciclo de cortes da taxa Selic. Rafaela Vitória, economista-chefe do Banco Inter, defende que esse espaço para o Comitê de Política Monetária (Copom) começar a reduzir os juros já existe.
"O Copom poderia começar a cortar juros já na reunião deste mês. Mas, como o último comunicado ainda foi rígido, o ritual deverá ser seguido, com o corte ficando só para agosto", afirmou Vitória em entrevista à Exame Invest.
Agosto, por sinal, tem se tornado o consenso de economistas para o início do ciclo de cortes. A economista, no entanto, disse que o BC ainda pode surpreender, cortando a Selic já na próxima reunião. "Os dados justificariam esse corte já em junho."
Confira a entrevista com Rafaela Vitória, economista-chefe do Banco Inter:
A inflação brasileira voltou a surpreender para baixo, com o IPCA de maio ficando em 3,94%. Quais foram as principais surpresas do dado?
A leitura dos dados em geral foi considerada bastante benigna. Houve uma grande surpresa, principalmente, com a desaceleração na parte de alimentos, mas também em serviços e na média dos núcleos, além de uma difusão menor. Os indicadores confirmam que a desaceleração da inflação está mais disseminada. Isso é uma ótima notícia para a política monetária.
Como o IPCA divulgado nesta semana altera a perspectiva para as próximas reuniões do Copom?
A política monetária já fez boa parte do efeito esperado. Já se tinha a expectativa de corte em agosto, porém, o Copom poderia cortar já na reunião de junho.
A reunião de junho poderia cortar, mas acredito que o Copom seguirá o ritual.O Copom poderia começar a cortar juros já na reunião deste mês. Porém , como o último comunicado ainda foi rígido, o ritual deverá ser seguido, com o corte ficando só para agosto. Os dados até justificariam um corte surpresa, mas há um cenário de alguma incerteza na questão da política fiscal.
Qual deve ser o ritmo dos cortes de juros?
O Banco Central tem se mostrado cauteloso e aberto para corte na sequência. O Banco Central poderia até começar com um corte de 50 pontos-base em agosto. Mas o cenário mais provável é de um corte inicial de 25 pontos-base, se estendendo para cortes de 50 pontos-base nas e terminando o ano com a Selic a 12%.
Um dos argumentos de quem ainda não vê espaço para cortes são as expectativas de inflação ainda elevadas. O mercado deve começar a revisar esses números para baixo?
As revisões das expectativas têm sido para baixo nas últimas semanas. O próprio dado de maio ficou abaixo do esperado, resultando em projeções do Focus de 0,37 para maio e 0,30 para julho. A inflação de junho está baixa, e a leitura corrente indica uma queda. Também se observa a queda nos serviços, principalmente nos combustíveis e alimentos, o que leva a uma inércia de inflação menor em 2024, à medida que a inflação deste ano seja menor. Com a inflação mais baixa, os reajustes do meio do ano deverão ser bem mais baixos, dada a inflação de 3,9% em 12 meses.
O PIB do primeiro trimestre divulgado na semana passada saiu bem forte, levando o mercado a revisar para cima o crescimento deste ano. Por que o crescimento do PIB do ano que vem foi revisado para baixo.?
O crescimento do PIB no primeiro trimestre foi impulsionado principalmente pelo setor agrícola, mas isso infla a base, pois a produção agrícola é volátil. Existe a probabilidade de a produção agrícola ser menor devido ao aumento dos custos de financiamento da safra, o que é natural. A safra atual foi beneficiada por fatores atípicos, e é provável que a produção agrícola no próximo ano seja reduzida. Além disso, o consumo está fraco e a indústria está patinando. A política monetária tem efeito na demanda.
Quais são as preocupações para 2024?
Para 2024, o problema está nos dados qualitativos, que podem pressionar o governo a implementar novos estímulos, como crédito subsidiado para a indústria automobilística e compra de eletrodomésticos. Esses subsídios pontuais podem ter efeitos negativos para a política fiscal e pressionar a inflação. O que preocupa é que um PIB mais fraco em 2024 pode provocar uma reação do governo em relação a isso. Se houver mais estímulos fiscais para 2024, pode haver um efeito adverso com uma inflação maior.
A queda de juros já em agosto poderia ter algum efeito positivo sobre o PIB de 2024?
Uma queda de juros a partir de agosto terá pouco efeito para 2024. Um PIB mais alto em 2024 depende de um ambiente internacional melhor, com acomodação da demanda global, observado a partir de 2023 até o início do próximo ano. Uma retomada da economia global pode trazer um crescimento maior para o Brasil, mas um corte de juros agora terá pouco efeito sobre isso. Se a inflação continuar alta por mais tempo, terá um efeito negativo, e a política monetária se tornará mais restritiva
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