Inteligência Artificial

Falsa automação: startup usou 700 engenheiros indianos para simular IA e inflar vendas

Com mais de US$ 445 milhões captados de investidores como Microsoft, a empresa vendeu uma inteligência artificial que, na verdade, não existia

Laura Pancini
Laura Pancini

Repórter

Publicado em 31 de maio de 2025 às 10h17.

Última atualização em 15 de julho de 2025 às 16h23.

A startup britânica Builder.ai entrou em insolvência após ser descoberta usando 700 engenheiros na Índia para escrever código manualmente, disfarçando a operação como automação. Com mais de US$ 445 milhões captados junto a investidores como Microsoft, a empresa vendeu uma inteligência artificial que, na verdade, não existia.

Criada em 2015, a Builder.ai vendia uma plataforma “no-code” com uma assistente virtual chamada Natasha, que supostamente montava aplicativos como peças de Lego. Na prática, pedidos de clientes eram repassados para uma equipe na Índia, que desenvolvia manualmente o software — uma operação escondida sob a fachada de automação.

O número de 700 engenheiros foi estimado por uma série de denúncias e análises feitas por especialistas do setor, além de relatos internos vazados, que mostraram o volume de profissionais trabalhando diretamente para compor os códigos manualmente.

Acúmulo de escândalos

Além da falsa automação, a empresa se envolveu em um esquema contábil conhecido como “round-tripping” com a startup indiana VerSe Innovation. Entre 2021 e 2024, as duas trocaram faturas de valores similares para inflar receitas diante dos investidores, segundo documentos obtidos pela americana Bloomberg. Isso fez a Builder.ai superestimar suas vendas em até 300% para credores.

Em 2023, a credora Viola Credit congelou US$ 37 milhões da Builder.ai após a empresa não honrar dívidas. Desde então, a companhia entrou em processo formal de insolvência no Reino Unido, com um administrador judicial nomeado para tentar recuperar ativos.

As autoridades americanas abriram investigação e emitiram intimações para que a Builder.ai entregue documentos financeiros detalhados, políticas contábeis e listas de clientes. A empresa reconheceu inconsistências nas vendas históricas, mas não detalhou o tamanho das irregularidades.

Automação sob suspeita

O caso da Builder.ai não é isolado. Em 2024, a Amazon anunciou o fim gradual do “Just Walk Out”, sistema que eliminava caixas em lojas de conveniência usando sensores e câmeras. Na prática, porém, o sistema dependia de mais de 1.000 funcionários na Índia para revisar vídeos e corrigir erros no processo de compra.

Diante dos custos e falhas, a Amazon substitui a tecnologia por carrinhos com scanner e caixas de autoatendimento, admitindo publicamente que o sistema original não era totalmente automatizado.

Essa mudança reforça uma tendência: projetos que vendem automação total, mas se apoiam pesadamente em trabalho manual remoto, têm limitações operacionais, financeiras e de escala.

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