PIB desmonta e desafio de acertar a mão se impõe ao Banco Central
Economistas cortam projeções para o PIB; revisão do Itaú Unibanco para 0,5% em 2022 dispara alerta no mercado financeiro
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Próximas decisões monetárias colocarão em foco – além das eleições – a autonomia alcançada pelo BC de Roberto Campos Neto (Divulgação/Divulgação)
Publicado em 15 de setembro de 2021, 10h40.
Última atualização em 15 de setembro de 2021, 16h05.
O mercado já virou o conversor e o ritmo de expansão do Produto Interno Bruto (PIB) começa a convergir para zero. Essa é a sinalização de economistas de bancos e consultorias. Mas o alarme que soou alto no mercado financeiro foi disparado pelo Itaú Unibanco, que, nesta terça-feira, cortou de 1,5% para 0,5% sua estimativa de crescimento para o Brasil em 2022. Essa projeção, compartilhada por outras instituições, equivale a um quinto do esperado em janeiro, quando 2,50% era a variação compartilhada pela maioria das casas.
Apesar da tensão política que permeia as análises de especialistas, tamanho ajuste de projeções -- que, pela pesquisa Focus, declinaram 0,40 ponto percentual em apenas dois meses -- não ocorre sem uma contrapartida monetária pesada. A política multiplica os ruídos que a inflação mais que pressionada emite. O aperto monetário está em curso há seis meses e seus efeitos começam a ser sentidos para valer daqui para frente em decorrência do espaço de tempo prescrito entre as decisões tomadas pelo Banco Central (BC) e a repercussão na atividade.
A taxa Selic disparou de sua mínima histórica de 2% em março para os atuais 5,25% ao ano. E deve alcançar 6,25% na semana que vem – quando o Comitê de Política Monetária (Copom) realiza a sexta reunião de 2021. Estará a dois encontros, portanto, do encerramento do ano.
O próximo movimento do Copom foi por ele sinalizado. O Banco Central (BC) segue indicando, em seus documentos, a manutenção do ritmo de ajuste da taxa básica que entrou na cadência de aumento de 1 ponto percentual há quase 45 dias. Ontem, durante o evento Macro Day, promovido pelo BTG Pactual (do mesmo grupo que controla a EXAME), o presidente da instituição, Roberto Campos Neto, reforçou que a prioridade do BC é a inflação e, portanto, o cumprimento do regime de metas. Contudo observou que o comitê não reagirá “sempre a dados de alta frequência”.
É inegável, porém, que a escalada da inflação, que em 12 meses encerrados em agosto alcançou 9,68%, ante 4,56% em janeiro, não é trivial. Ao Copom e, portanto, ao comando do BC, se impõe, na próxima quarta-feira, 22, o desafio de contemporizar as expectativas de mercado com um ajuste adequado de Selic para que a atividade não desmonte de vez e contrate um novo ciclo de retração – desastroso para o governo em ano de eleição.
Setor de Serviços ajuda, mas não resolve
Em relatório, o Itaú Unibanco é explícito. “Revisamos nossa projeção de crescimento do PIB de 5,7% para 5,3% em 2021 (após a divulgação do PIB do segundo trimestre e dados recentes) e de 1,5% para 0,5% em 2022 (em razão da taxa de juros mais alta)”, diz Mario Mesquita, economista-chefe e ex-diretor de Política Econômica do BC.
Ele reconhece que o crescimento do PIB deve melhorar no segundo semestre deste ano, especialmente devido à esperada normalização dos setores de serviços que dependem de interação social. Contudo os fatores de crescimento estão se esgotando. E, aqui, entra a taxa de juro. Mas o Itaú vê pela frente uma política fiscal também contracionista, mesmo levando em conta o novo programa de transferência de renda, pois o gasto público primário deve recuar para nível próximo ao observado em 2019 em termos reais.
“Vemos desaceleração do setor industrial global e queda de preços de commodities no ano que vem. Além disso, a atividade econômica não se beneficiará mais do impulso advindo da reabertura do setor de serviços, algo que, na nossa visão, ficará restrito ao segundo semestre deste ano”, diz o Itaú.
A Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi) divulgou nesta manhã sua nova projeção para o PIB de expansão de 1% para 2022. Nicola Tingas, economista-chefe da entidade, atribui a deterioração de expectativas e projeções à combinação de incertezas, riscos e crises. “Inflação próxima a 10% no pico em 12 meses, Selic com correção lenta pelo Copom, crise energética e provável racionamento, Orçamento público irrealistas que ainda aguarda votação, pagamento de precatórios sem solução, reforma de impostos polêmica e também pendente, financiamento do Auxílio Brasil incerto, crise político institucional e taxa de câmbio depreciada devido ao risco país.”
A MB Associados, que reduziu sua projeção para o PIB de 2022 de 1,4% para 0,4%, alerta que a releitura do indicador “talvez não seja a última”. Sérgio Vale, economista-chefe da consultoria, lembra que as revisões para baixo foram generalizadas dentre os segmentos, com exceção da agropecuária, cuja projeção subiu. “Espera-se uma safra melhor do que esse ano com certa normalização do regime de chuvas para a agricultura, apesar de um possível La Niña fraco que teremos. Isso é diferente do regime de chuvas necessário para os reservatórios no caso da crise hídrica. As chuvas serão boas para a agricultura, mas provavelmente não tanto para resolver a crise energética”, afirma.
Como indicam economistas consultados pelo EXAME IN, não há saída boa do atual cenário de inflação fortemente pressionada e com ameaça de agravamento da crise hídrica, inclusive porque as consequências das próximas decisões monetárias colocarão em foco – além das eleições – a autonomia legal alcançada pelo BC de Roberto Campos Neto.
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