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Contra o voto contra: consultorias dizem não à inovação sugerida pela Vale

ISS e Glass Lewis recomendam que acionistas rejeitem sugestão da mineradora para adoção de voto negativo

GV

2 de março de 2021 às 08:29

A Vale, a maior empresa da B3, avaliada em R$ 485 bilhões, vai enfrentar uma oposição para aprovar o sistema de voto negativo proposto aos acionistas para eleição do conselho de administração: as consultorias de recomendação de voto. Tanto a ISS, que lidera no mercado americano, como a Glass Lewis, com mais influência sobre fundos europeus, recomendam a rejeição do item que trata do assunto. Os relatórios foram divulgados na sexta-feira.

A assembleia da Vale está marcada para o próximo dia 12. A mineradora propôs uma reforma de seu estatuto social, a principal ferramenta com as regras de governança de uma empresa. Nele, quer implantar o sistema de voto contrário ou negativo e a eleição do conselho sempre nome a nome, sem sistema de chapa – entre diversas outras sugestões.

A Glass Lewis, por exemplo, destacou que não rejeita o modelo do voto negativo, adotado em alguns outros mercados. No entanto, disse temer eventuais maus usos dessa ferramenta. Pela consultoria, a Vale deveria apresentar no futuro uma outra redação, que consiga resolver as preocupações demonstradas até o momento.

O modelo de votação, uma inovação no mercado brasileiro, foi sugerido pelo comitê de nomeação formado pela empresa em julho do ano passado, com Pedro Parente e Alexandre Silva — nenhum deles conselheiro. Os trabalhos do comitê são assessorados por Paulo Aragão, sócio fundado do escritório BMA. Os dois renomados executivos de mercado trabalham para formar uma sugestão de lista com nomes para o conselho da mineradora, que será efeito na assembleia geral ordinária deste ano — que ainda não foi convocada.

Fontes próximas à Vale explicaram que a sugestão foi feita após contato da Vale com seus investidores, em especial, estrangeiros. Os relatórios do ISS e da Glass Lewis serão, portanto, um teste à independência das gestoras. Atualmente, 54% do capital da Vale estão nas mãos de investidores estrangeiros – 38% pulverizado e 16% divididos em fatias quase iguais entre BlackRock, Capital World Investor e Capital Research Global Investors.

A inovação do voto negativo enfretou resistência dentro e fora da Vale. Dentro, os conselheiros independentes Marcelo Gasparino e Isabela Saboya votaram contra a sugestão. A Associação de Investidores no Mercado de Capitais (Amec) também não aprovou a proposta e Mauro Rodrigues da Cunha, ex-presidente da associação e do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), fez duras críticas.

O assunto foi parar na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), após queixa apresentada por Gasparino ao regulador. Até o momento, porém, não existe nenhuma manifestação pública do regulador sobre o caso.

A Vale reforça que em seu site de relações com investidores informa que “a votação majoritária é amplamente usada no exterior". De acordo com o Council of Institutional Investors (CII), quase 90% das empresas S&P 500 usam a votação por maioria de alguma forma. A mineradora também afirma que grandes empresas do setor usam esse método. "O Conselho de Administração e o Comitê de Nomeação acreditam fortemente ser do melhor interesse de nossos acionistas a adoção de votação majoritária para a eleição de conselheiros, conferindo maior valor aos votos dos acionistas”, diz nota da companhia.

O que a Vale chama de votação majoritária, segundo o CII, é a escolha dos eleitos apenas por aqueles que receberam mais votos a favor do que contra. Entretanto, a definição da composição não é pelo líquido da votação, mas por aqueles que receberam o maior número de votos favoráveis. O voto contrário é usado apenas para situações de rejeição, quando um candidato recebe mais votos rejeitando sua indicação do que a favor.

O conselho que será eleito neste ano de 2021 marca a transição da Vale para uma empresa de capital totalmente pulverizado na bolsa, uma vez que os principais acionistas e ex-controladores as fundações Previ, Petros, Funcef, além de Bradespar e Mitsui, não possuem mais nenhum tipo de acordo que as vincule. Juntas, somam ainda perto de 20% do capital. O último combinado venceu em novembro, e era uma versão transitória feita após a empresa ter migrado para o Novo Mercado da B3.

Na sexta-feira, a Vale divulgou o balanço do quarto trimestre de 2020, com crescimento de quase 50% na receita líquida em dólar, para US$ 14,8 bilhões. O Ebitda saiu de US$ 3,5 bilhões para US$ 4,2 bilhões, na comparação anual. A soma nessa linha superaria os US$ 9 bilhões, mas sofreu impacto pelo Acordo Global de Reparação, relacionado à Brumadinho, mais doações para combate à covid-19 e provisões para ajustes nas barragens. O que mais alegrou os acionistas, porém, foi anúncio de um dividendo de US$ 7,3 bilhões relacionado aos resultados do segundo semestre de 2020 e do primeiro semestre deste ano.

A Vale terminou dezembro caixa líquido, ou seja, com mais dinheiro em seus cofres do que dívidas: US$ 14,2 bilhões em aplicações para US$ 13,3 bilhões em vencimentos. Contudo, o valor expandido dos compromissos é muito maior, considerando as penalidades relacionadas à Brumadinho e Mariana (Samarco), alcançando um total líquido de US$ 13,3 bilhões — ou seja, o total devido pela companhia dobra.

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