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Entrevista: Chris DeArmitt, especialista em plástico, defende o material como solução ecológica

Em conversa exclusiva com EXAME, maior especialista no material no mundo, explica como a ciência tem comprovado o oposto do que a sociedade sempre acredita

Chris DeArmitt, cientista e autor do livro "The Plastics Paradox” (Divulgação)

Chris DeArmitt, cientista e autor do livro "The Plastics Paradox” (Divulgação)

Sofia Schuck
Sofia Schuck

Repórter de ESG

Publicado em 23 de outubro de 2024 às 06h00.

Última atualização em 23 de outubro de 2024 às 10h20.

Quando você pensa em plástico e seu impacto no planeta, o que vem primeiro na sua cabeça? É fato que muitas pessoas associam o material como um vilão ou problemão ambiental. Mas e se alguém te falasse que esta pode ser mais uma solução ecológica? Chris DeArmitt, pesquisador e maior especialista em materiais plásticos do mundo e autor do livro "O Paradoxo dos Plásticos", quer provar que essa é a verdade da ciência -- e que ninguém conta.

Depois de ler mais mais de 400 estudos científicos e se debruçar anos no tema, Chris lançou o livro para combater os mitos em torno do plástico e quebrar crenças, que segundo ele, são baseadas em informações equivocadas e envolvem conflitos de interesse entre indústrias e governos.

"A única razão pela qual comecei a falar sobre plásticos no meio ambiente é porque minhas filhas ouviram coisas que não eram verdade na escola. Então, comecei a estudar por conta propria. Eu sou apaixonado pela verdade e por resolver problemas. E a única maneira de fazer isto é começar com bons dados", conta.

Para compartilhar evidências e tudo que aprendeu, o pesquisador lançou um livro disponível em cinco idiomas, que pode ser baixado gratuitamente na internet. E há algumas semanas, esteve no Brasil pela primeira vez para participar do Congresso Brasileiro do Plástico, em São Paulo. Em entrevista exclusiva à EXAME, Chris DeArmitt fala sobre as informações equivocadas que circundam o plástico, a onda de desinformação, economia circular e o impacto de outros materiais alternativos. Confira: 

Em seu livro The Plastics Paradox, você menciona existirem muitos mitos em torno dos plásticos. Quais seriam estes mitos?

Bem, quase tudo. Eu li mais de 400 estudos científicos, e quando você compara o que os cientistas e as pessoas pensam, é o oposto exato. Um exemplo, é que as pessoas pensam que estamos nos afogando em plástico. E se você olhar os números, o plástico representa 0.5%, ou seja, metade de 1% de todos os materiais que usamos e gera menos de 1% de todo o impacto. Mas isso não é o que ouvimos online. Na realidade, se trata de menos de 1% do nosso problema e a sociedade foca nisto e ignora completamente os outros 99%. Isso significa que nunca vamos realmente vencer, porque estamos ignorando a maior parte do problema.

Eu fico bastante surpresa com essas informações... 

Eu também fiquei chocado na primeira vez que vi isso em um livro e verifiquei, e é verdade. Você pode até perguntar à Siri: "Ei, Siri, quanto plástico usamos por ano?" ou "Ei, Siri, e quanto material usamos?" Quer dizer, essa não é a maneira científica de descobrir, mas uma pessoa normal pode encontrar esse número em segundos.

Na sua opinião, por que esses mitos existem e por que a percepção pública vê o plástico como um  vilão ambiental? 

É sempre difícil dizer, mas sei que não é surpresa que indústrias concorrentes -- se você olhar para o vidro, o metal e o papel -- elas perderam participação de mercado, certo? Os plásticos tomaram parte de seus negócios. Portanto, é do interesse delas gastar dinheiro tentando fazer com que os plásticos pareçam ruins, para assim recuperarem seus negócios. Já ouvi de empresas que parte disso está acontecendo. E não é surpresa, há dinheiro envolvido.

Outra parte é que alguns grupos ambientais em quem confiamos – não vou mencionar nomes – desistiram do meio ambiente e estão nos dizendo o que queremos ouvir para ganhar dinheiro, em vez de dizer a verdade. Então, essas são algumas das razões pelas quais o que a ciência diz atualmente é o oposto do que as pessoas acreditam.

Também no seu livro, você afirma que muito do que acreditamos sobre plásticos e ambiente vem de boatos da internet e notícias falsas. Ao mesmo tempo, você afirma que evidências científicas refutam essas crenças. Quais são elas? 

Por exemplo, se você olhar online, muitas organizações dizem que os plásticos não se degradam, certo? Ou dizem que levam 500 anos para se degradar. Se você olhar um estudo científico, há dois estudos sobre sacolas plásticas que mostram que elas se degradam em menos de um ano. Então, temos todo mundo pensando que os plásticos não se degradam, sem nenhuma evidência. Você pode verificar online, não encontrará um único estudo que diga que uma sacola plástica leva centenas de anos para se degradar. Nenhum cientista jamais disse isso. E quando você verifica a ciência, encontra milhares de estudos sobre a degradação do plástico.

Na verdade, as empresas gastam 5 bilhões de dólares por ano para colocar aditivos neste material para desacelerar a degradação, porque na realidade ela é rápida. E é por isso que uma sacola plástica se degrada em menos de um ano, porque é muito fina e não tem muitos aditivos. Enquanto, por exemplo, se você tivesse um tubo de plástico, ele poderia durar 100 anos, porque você coloca muito mais estabilizadores nele para que dure mais.

Quer dizer que estamos vivendo em meio a muita desinformação sobre o plástico no mundo, certo?

Sim, há um estudo que diz que a mentira tem 70% mais probabilidade de ser retuitada do que a verdade. Então, pense nisso... Significa que uma mentira tem uma probabilidade exponencialmente maior de se tornar viral, elas são mais emocionantes.

E qual o impacto do advento da inteligência artificial na propagação da desinformação?

Hoje é muito fácil, não é? Com as redes sociais, dizer algo e conseguir muitos boots para repetir isso, tem um custo muito baixo. Antigamente, se você quisesse espalhar mentiras, seria caro. Você teria que, por exemplo, comprar uma página inteira de anúncio no New York Times. Agora, você pode espalhar informações que não são verdade por quase nada.

Você também defende que além de não serem vilões, os plásticos podem ser uma solução ecológica. Como? 

Sim, tudo cria impacto, certo? Tudo o que fazemos, quando saímos da cama, escovamos os dentes... E a única maneira de saber o que causa menos impacto é através de uma análise de ciclo de vida. Isso soma tudo: quando escovo meus dentes, por exemplo, quanta energia foi usada? Quanto produto? Era água quente ou fria? Tudo é incluído. Aí você pode mensurar. E se quisermos ajudar o meio ambiente, devemos fazer atividades que gerem o menor impacto.

Então, se você pesquisar "análise de ciclo de vida sacola", porque estamos sempre falando delas, você encontrará 30 estudos de ciclo de vida sobre este material. E todos concordam e dizem que as sacolas plásticas causam menos dano do que as de papel ou algodão. Então, por que estamos proibindo e taxando a opção que causa o menor impacto, de acordo com a ciência? E os governos não estão olhando para isto, estão proibindo sacolas e percebendo três anos depois que isso aumentou o dano, e então revertendo a proibição porque perceberam o erro. Mas se tivessem lido os estudos, saberiam que era um erro antes de cometê-lo.

Neste sentido, pensando nos países que implementaram restrições ou proibiram as sacolas plásticas, a medida não faria sentido então? 

É uma loucura. Imagine tirar algo que é cientificamente comprovado, de acordo com centenas de estudos, como sendo a melhor opção. Se você substituir o plástico das sacolas, você precisa em média de quatro vezes mais de outros materiais. Então, você gera também quatro vezes mais lixo, três vezes mais dióxido de carbono e gases de efeito estufa e precisará usar duas vezes mais combustível fóssil. Essa é a escolha. E a outra razão pela qual não faz sentido, é: por que você focaria em 1% e ignoraria 99% dos materiais? Isso significa que focar no 1% do material mais ecológico que temos é completa insanidade, de acordo com a ciência.

Entendo que o problema seria um conflito de interesses, certo?

Estes grupos nem querem deixar os cientistas entrarem nas reuniões. Eles querem criar políticas e impedir que os cientistas adentrem. Pois se você entra e mostra 20 estudos ao longo de 50 anos que mostram que não há quase nenhum plástico no oceano, e que os que estão na redes de pesca, não são o que causam o real problema, eles não querem que os políticos vejam os fatos. Estão [estes grupos] criando políticas e ganhando muito dinheiro com base em informações que não são fatos. Eles nem querem que os cientistas falem.

Mas e quanto as fotos de tartarugas enroscadas em plásticos e animais marinhos que circulam?

Na verdade, esta manhã, no LinkedIn, um homem disse que acabou de voltar de sete dias em um navio de cruzeiro pelo Atlântico Norte. Em sete dias, ele e a esposa não viram um único pedaço de plástico. Então, essa é a realidade, mas não é o que estão nos dizendo.

Você acredita também que materiais alternativos, como plásticos biodegradáveis e compostáveis, podem ser uma solução viável e mais sustentável? 

Materiais degradáveis são algo que as pessoas estão procurando, porque querem que seu lixo desapareça como mágica. É por isso que estão interessadas, querem poder jogar seus resíduos fora e que ele sumam como no Harry Potter, certo? Então, essa é a força motriz. Mas o que elas não percebem é que, quando algo é degradável, há um aumento do lixo, pois a sociedade pensa que tudo bem jogar no chão.

Então, os materiais degradáveis, na verdade, aumentam o lixo. Esse é o primeiro problema. O segundo é que a degradação significa converter sólidos em CO2. E isso é o que as pessoas estão tentando evitar. Por isso, entendo não serem uma boa ideia. E a outra razão pela qual eles não fazem sentido é que os plásticos normais, como polietileno, polipropileno, PET, todos se degradam relativamente rápido. O público apenas não entende isso. Portanto, não há necessidade de tornar os plásticos degradáveis, porque eles já são. Existem centenas e centenas de estudos sobre.

Quais os avanços recentes na ciência dos materiais que você considera mais promissores para tornar os plásticos mais sustentáveis? 

Sempre há melhorias, mas o consumidor não enxerga. Normalmente, os cientistas estão tentando fazer o mesmo objeto com cada vez menos material. Se você olhar para uma garrafa de PET, por exemplo, antigamente precisávamos de 25 g para fazer uma de 1 litro. E agora estão conseguindo fazer com metade. Então, a cada ano usam menos e menos material, tornando tudo mais eficiente. Isso significa menos gases de efeito estufa, menos combustível fóssil, mais rápido de degradar, mais fácil de reciclar. Então, tem havido muitas mudanças, mas o público não sabe muito sobre elas.

E outra vantagem ou avanço é que as pessoas pensam que os plásticos são ruins porque são feitos de combustível fóssil. Mas o que elas não percebem é que você pode produzí-los sem. Você pode comprar polietileno e polipropileno feitos de plantas. No final, é o mesmo plástico. Mas quando olho para alguns dos outros novos polímeros sugeridos, eles aumentam os danos em comparação com o polietileno, polipropileno e PET, custam mais e são piores para o meio ambiente -- na maioria dos casos.

E por que as empresas não falam sobre isso na produção de plástico? 

Bom, o trabalho das empresas não é ser verde, e sim, ganhar dinheiro. Então, elas criam inovações e fazem alternativas, mas essas geralmente aumentam os custos e os danos. E fazem isso o tempo todo. Eu vejo diversas fazendo evidências que, na verdade, não são substanciais.

E o que elas [as empresas] podem fazer para mitigar os efeitos da poluição plástica? 

Esta questão é interessante, porque, no momento as pessoas estão culpando empresas de refrigerantes pela poluição, certo? Você provavelmente já viu manchetes dizendo que essa ou aquela é a maior poluidora do mundo. E isso não é verdade. A poluição é lixo e é causada pelo próprio indivíduo. E nós sabemos as soluções: educação, multas e destinação correta. São as três coisas que funcionam

A resposta para a poluição é perceber que, na verdade, é lixo, e que conhecemos as soluções. É mudar o comportamento. Não devemos culpar empresas ou materiais pelo lixo, especialmente porque estudos mostram que, quando você substitui os plásticos, acaba gerando muito mais.

Na transição para uma economia circular, quais desafios o plástico apresenta e como podemos implementar práticas de reciclagem mais eficientes? 

Como cientista, eu acredito que sempre devemos fazer o que cria menos danos. Às vezes, isso é circular e às vezes não. Assim como a reciclagem às vezes é verde, mas nem sempre. Em alguns casos, se usa mais energia, água e combustível fóssil para reciclar do que para fazer um material novo. Este é o primeiro ponto.

[grifar]Muitas pessoas estão perseguindo a circularidade como se fosse uma cura mágica, mas não é. Às vezes, é a escolha errada. Quando se trata de plásticos, a reciclagem é verde.

Quando você recicla, ele fica 70 ou 80% mais sustentável, porque você não precisa produzí-lo novamente. Você apenas derrete e faz uma nova peça, e isso consome menos energia do que fabricar um novo. Só que o público não entende dessa forma e pensa que precisamos reciclar para tornar os plásticos verdes, quando a ciência diz que este material já tem o menor impacto, mesmo sem reciclagem. O que acontece é que ele fica ainda mais ecológico.

Qual então seria o pior material, pensando em poluição e impacto ambiental? 

Se você olhar os números, o papel é pelo menos duas vezes pior que o plástico, gerando duas vezes mais lixo. Ele também não se decompõe, porque você coloca papel, plástico, metal e vidro enterrados em um aterro sanitário. E aqui está o porquê de o papel ser muito pior. As pessoas criticam o plástico de uso único, certo? E, por algum motivo, não olham para o papel. E ainda há uma enorme quantidade de papel de uso zero, que seria por exemplo aquele que chega na sua caixa de correio e vai direto para o lixo. E ninguém está falando sobre isso.

E por que não entendemos o papel como um problema, como acontece com o plástico?

Uma das razões é que o plástico é relativamente novo, em uma escala de tempo biológica. Esses outros materiais, como o papel, nós os usamos há milhares ou dezenas de milhares de anos, então estamos acostumados. Pensamos neles como naturais. Pensamos no concreto, que usamos há séculos, e no papel, que vem desde o papiro. Em algum lugar no fundo do nosso coração, vemos esses materiais e pensamos: "Ah, é natural, deve ser ok". Mas isso não é verdade. Precisamos olhar para a ciência, em vez de confiar em nossos sentimentos.

Você já trabalhou com empresas como Apple, Disney e outras. Como você as ajudou com os desafios complexos relacionados a resíduos?

Quando eu falo sobre plásticos no meio ambiente, isso é meu hobby, não meu trabalho. Meu trabalho é ajudar empresas a fazer melhores plásticos, melhores materiais e resolver problemas. Atuo com empresas que estão tendo problemas na produção, como peças que estão quebrando, que precisam ser mais fortes, mais leves ou mais baratas.

Qual o papel da economia circular nas discussões da COP29 em Baku?

Eu não acompanho muito, pois não tenho interesse em política. Sou cientista, então não posso responder a pergunta. Mas, de modo geral, quando se trata de circularidade, é importante garantir que seja realmente ecológico, em vez de apenas seguir.

Pense em um cachorro correndo no seu jardim, perseguindo o próprio rabo. O cachorro fica cansado, usa energia, destrói a grama, cria resíduos e precisa comer. Aí esta "circularidade" que parece bonita acaba usando mais água, mais energia, e cria novos resíduos dos quais ninguém fala. Eles sempre mostram um círculo perfeito, mas manter esse círculo gera muito lixo novo. Ou seja, a economia circular às vezes é boa e às vezes não, e a sociedade precisa ter cuidado. Existem livros que provam que alguns materiais não devem ser reciclados, porque não é ecológico.

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