Economia

Economistas iniciam ano otimistas pela 3ª vez. Por que 2020 será diferente

Além da menor incerteza política, o ano de 2020 tem a seu favor a Selic mais baixa da história, que deve seguir alavancando o consumo das famílias

Brasil_prédios_bandeira brasileira. Foro: FG Trade / Getty Images (FG Trade/Getty Images)

Brasil_prédios_bandeira brasileira. Foro: FG Trade / Getty Images (FG Trade/Getty Images)

Ligia Tuon

Ligia Tuon

Publicado em 4 de janeiro de 2020 às 08h00.

Última atualização em 13 de janeiro de 2020 às 16h16.

São Paulo — Pelo terceiro ano consecutivo, as instituições financeiras iniciam o mês de janeiro otimistas em relação à economia brasileira, traçando estimativas de que o Produto Interno Bruto (PIB) avance cerca de 2%. Nos dois anos anteriores, em 2018 e 2019, analistas de mercado trabalhavam com números parecidos, mas as expectativas rapidamente se deterioram ainda no primeiro semestre. Por que 2020 pode ser diferente?

Um ponto importante a ser considerado é que, nos últimos dois anos, o Brasil passou por um contexto mais agudo de incerteza política, o que torna as expectativas econômicas muito mais sujeitas a erro, segundo Robson Gonçalves, economista e professor da FGV. "Boa parte das previsões para 2019 foi contaminada pela volatilidade política, causada pela disputa eleitoral muito polarizada em 2018", diz. 

O Brasil dos últimos anos tem desafiado os analistas econômicos e políticos. O ano de 2016 foi consumido pelo impeachment da então presidente Dilma Rousseff. Em 2017, o vazamento da delação premiada feita pelo empresário Joesley Batista, dono do grupo JBS, fragilizou o governo de Michel Temer. A greve dos caminhoneiros gerou um apagão de abastecimento na primeira metade de 2018.

No final de 2017, porém, as projeções dos analistas indicavam um crescimento de 2,7% para o ano seguinte. O PIB acabou crescendo 1,1% em 2018.

"Hoje, a gente tem um governo que deve seguir em frente, com as suas turbulências também, mas com um grau de incerteza bastante menor", diz Gonçalves.

As expectativas em relação ao governo Bolsonaro até o começo do ano passado embutiam também a esperança de uma aprovação rápida da reforma da Previdência e o consequente encaminhamento da crise fiscal brasileira. As previsões de mercado entraram 2019 apontando para um crescimento de 2,5% da economia no ano.

A demora do avanço da agenda de reformas e da recuperação econômica, no entanto, foi jogando esse número para baixo por meses, até que ele ficasse abaixo de 1%. Só voltou a subir após o avanço da reforma da Previdência no Congresso, em outubro.

Hoje, as estimativas de economistas e instituições financeiras consultadas pelo Banco Central (BC) apontam para uma expansão do PIB de 1,17% em 2019 (dado que deve ser confirmado pelo IBGE em março). Para 2020, é de 2,30%.

Esse nível de desempenho foi registrado pela última vez no país em 2013.

Vento favorável

Além da menor incerteza política, o ano de 2020 tem a seu favor a Selic, taxa básica de juros do Banco Central, em seu menor nível da história.

"Os juros baixos são o principal vento a favor da economia neste momento. Somados ao efeito do carregamento estatístico (que considera o crescimento levado de um ano para o outro), parece muito tranquilo a gente atingir um aumento de mais de 2% no PIB no ano que começa", diz Gonçalves.

Vale ressaltar que o número que o mercado acompanha sobre o PIB não é a evolução do valor bruto do início de janeiro em relação ao de um ano antes. O indicador é resultado da comparação entre o nível médio do PIB de um ano com o do ano anterior.

O PIB de 2019 vai encerrar o ano acima da média do próprio ano. Isso gera o que os economistas chamam de efeito carregamento, que vai ser na ordem de mais de 1%, segundo Gonçalves.

"Se o PIB de 2020 ficar no nível em que encerrou 2019, ele vai estar mais de 1% acima da média de 2019. Portanto, nós já temos um crescimento garantido acima de 1%, que é o avanço dos últimos três anos", diz.

O economista alerta, porém, que esses efeitos positivos são de curto prazo. "Uma vez que 2020 parece que está garantido, a gente tem que começar a olhar para 2021, 2022 e 2023. E a parte principal da lição de casa a ser feita é formada pela reforma tributária e pelo incentivo ao investimento produtivo, que tem ficado em níveis muito baixos historicamente", diz. 

Selic em queda, inflação controlada e melhora, ainda que lenta, do mercado de trabalho devem continuar ajudando a dar tração à demanda doméstica. Isso tem grande impacto no crescimento econômico, já que o consumo das famílias representa mais de 70% do PIB brasileiro.

A previsão do Goldman Sachs para o crescimento da economia neste ano é de 2,2%, impulsionado por uma demanda doméstica mais firme e pelo avanço dos investimentos privados. O banco considera que as perspectivas macroeconômicas e financeiras para o Brasil continuam desafiadoras, política e economicamente, "mas reconhecidamente mais esperançosas do que nos últimos anos", escreveu a instituição em relatório divulgado em dezembro.

O equilíbrio mais sólido é caracterizado, segundo o Goldman, pela política fiscal mais rígida e disciplinada, pela política monetária e financeira menos restritiva e pela moeda competitiva. "O crescente papel do setor privado na geração e alocação de recursos na economia e um cenário regulatório mais favorável ao mercado e ao investimento são desenvolvimentos esperançosos que devem pagar dividendos de produtividade e crescimento no futuro", diz.

Essa aceleração prevista, segundo o banco, deve ser apoiada por um "impulso no setor de crédito, maior acomodação das condições monetárias e financeiras, fortalecimento leve da confiança dos consumidores e das empresas e melhoria gradual do mercado de trabalho".

O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) destaca que a aceleração do crescimento deve ocorrer por meio da ocupação da capacidade ociosa da economia. A expectativa do órgão para 2020 é que o PIB cresça 2,3%. O aproveitamento da capacidade instalada sem utilização, porém, tem um limite. Depois disso, será preciso perseguir aumentos de produtividade para continuar crescendo.

"Essa aceleração do crescimento dependerá da continuidade das reformas no Congresso, especialmente da reforma tributária e da administração pública. A perspectiva da política fiscal, em particular quanto à capacidade de manter a regra do teto dos gastos, é considerada chave para a consolidação do crescimento", disse o instituto em relatório publicado em dezembro.

O Credit Suisse espera que o PIB cresça 2,5% em 2020, também impulsionado principalmente pelo consumo das famílias. O banco acredita que o ambiente mais reformista deva permanecer em vigor ao longo dos próximos dois anos, à medida que o governo avança nas agendas fiscais e de produtividade.

Faz parte desse cenário "alguma parte dos Projetos de Emenda Constitucional (PEC) submetidos pelo governo ao Congresso e aprovada em 2020 ou 2021", destaca a instituição em relatório recente.

Apesar de o clima internacional de guerra comercial e desaceleração das principais economias do mundo seguir inspirando cuidados, a opinião geral de analistas é que o quadro doméstico brasileiro se sobrepõe a esse cenário, o que "permite uma retomada mais forte do que temos vivido até agora", diz a consultoria 4E em relatório recente. A expectativa da 4E é de que o PIB avance 2,8% neste ano.

Acompanhe tudo sobre:Crescimento econômicoeconomia-brasileiraGoverno BolsonaroPIBPIB do Brasil

Mais de Economia

Governo envia ao Congresso proposta de orçamento para 2025 com salário mínimo de R$ 1.509

Inflação na zona do euro cai para 2,2% em agosto e aproxima-se da meta do BCE

Governo envia ao Congresso indicação de Galípolo e projetos para aumentar alíquotas da CSLL e da JCP

Lula diz que Galípolo terá autonomia no BC: 'Se ele falar que tem que aumentar juros, ótimo'

Mais na Exame