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Por Márcio de Freitas*

A internet envolve, seduz, diverte, informa, distrai e nos leva da vida real ao mundo virtual de uma forma sorrateira e impactante, mudando hábitos e comportamentos sociais. Hoje, quase todos estamos imersos na grande rede mundial de computadores e celulares, carros e eletrodomésticos, ainda na onda pré inteligência artificial que deve se tornar um tsunami em breve. Por isso, é importantíssimo observar o processo movido pelo Estados Unidos da América contra o Google.

A questão vai muito além da acusação dos gastos de 10 bilhões de dólares por ano para construir um monopólio de buscas pela internet. É  monopólio sim, mas que afeta também a forma de se relacionar com o poder, de como o cidadão se informa, forma opiniões e consolida seus conceitos – ou preconceitos. E como ele vê e reage à política e aos políticos.

O já clássico filme Matrix tinha metáfora mais interessante do que os efeitos especiais. A grande máquina interligada a humanos dormentes sugava energia dos corpos inertes e tornava humanos em escravos com o único intuito de se alimentar da força de sonhos que movem os homens, e os transformava em verdadeiros vegetais. No mundo atual, cada instante que o cidadão dispensa à rede mundial é mais um dólar no bolso de algum criador de plataforma de venda de produto, publicidade legal ou disfarçada. A grande máquina interligada é mais eficiente caixa registradora já criada pela inteligência natural. 

Enquanto compartilhamos nossa vida, alguns muito mais vivos singularizam suas fortunas numa concentração de riqueza poucas vezes vista na história. É o maior negócio do mundo, e não tem nada grátis em cada click: Google, Meta, Amazon e seus similares chineses seguem a mesma lógica financeira. Os big empresários canalizam a energia criativa de bilhões de pessoas para suas contas bancárias, sem fazer grande esforço. Afinal, a grande maioria dos perfis trabalha gratuitamente para eles, quer saiba ou não. Nada pagam por isso: quem compartilha não participa da partilha trilionária das novas plataformas tecnológicas. Nem quem produz conteúdo qualificado é remunerado de forma adequada. 

A briga inicial por direitos autorais transpareceu primeiro na música, onde os CD foram dizimados com velocidade assustadora pelos sites de música, como Napster, seguidos de aplicativos de streaming. Hoje, está mais acirrado no conflito na indústria da informação. O slogan já apagado do velho impresso dizia que informação é poder… Poder e dinheiro.

Mudança recente no algoritmo do Google retirou muito trânsito dos sites noticiosos. Alegações técnicas à parte, não é com notícias esdrúxulas e escândalos que se faz uma nova Ágora. O sonho de uma rede mundial esclarecida fica cada vez mais obscuro com a lógica de se lucrar a todo custo, todo o tempo, em qualquer lugar, seja de quem for. Empresas tem responsabilidade social. O lucro pode ser o objetivo central do empresário, mas lucro a que custo? 

O custo pode ser a democracia? Sim. Nos últimos anos, a tão sonhada democracia tecnológica cantada na Primavera Árabe foi varrida do manda do Oriente Médio como as construções do Marrocos o foram pela tempestade assustadora dos últimos dias. O que a internet tem alimentado de fato é o autoritarismo, a segmentação por diferenças raciais, a divisão por riqueza e o distanciamento entre grupos sociais que antes exercitavam o diálogo. O custo pode ser a democracia, se não houver regulamentação. 

Note: uma mudança no algoritmo é capaz de diminuir artificialmente a relevância de uma notícia, um personagem, um partido, um governo para toda a sociedade. Ou de todos partidos, políticos e governos. Se todos ficam menores, seus atos e fatos são menos conhecidos, então será a ignorância a estabelecer os parâmetros para julgamento. Haverá melhor escolha com piora no nível de informação e conhecimento? Pelo contrário.

O processo nos Estados Unidos trata de um monopólio de mercado, mas a política pode estar sendo mais afetada do que acredita nossa vã capacidade de encontrar o buscador certo na rede. Regular é preciso. E é uma questão urgente, que ainda dormita no Congresso apesar da relevância do tema e dos tempos matrixianos que vivemos. Políticos cada vez mais se esforçam para serem notados, mas os olhos dos internautas estão sendo levados para outros clicks. A política existe para isso: solucionar crises antes que elas sejam grandes demais, e essa já é uma big crise mundial.

*Márcio de Freitas é analista político da FSB Comunicação  

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