
Vice-presidente Hamilton Mourão (Ueslei Marcelino/Reuters)
O setor produtivo “desceu do muro.” Essa é uma das avaliações feitas pelos signatários da carta solicitando medidas para conter o desmatamento, endereçada ao vice-presidente Hamilton Mourão. Assinam o documento 38 empresas, de diversos setores.
A expectativa é que haja uma mudança de enfoque na política ambiental. No lugar do afrouxamento das regras e da fiscalização, o famigerado “passar a boiada”, como definiu o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, as empresas querem um endurecimento do governo contra o desmatamento ilegal. Com o atual ritmo de destruição da Amazônia, elas temem perder o acesso a mercados externos de alto valor agregado, como o europeu.
“Nós temos um arcabouço legal único, que não é perfeito, mas funciona”, afirma Marina Grossi, presidente do Centro Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (Cebds). “Dá para produzir sem destruir”. O Cebds, que reúne mais de 60 grandes grupos empresariais brasileiros, foi a organização que coordenou a iniciativa.
Para Walter Schalka, presidente da Suzano, o Brasil precisa assumir um papel de protagonismo nas discussões ambientais globais e liderar o mundo em direção a uma economia de baixo carbono. “Para alcançarmos um novo papel na geopolítica global, nós, como nação, precisamos demonstrar nosso compromisso com o desmatamento ilegal zero”, afirma.
O executivo ressalta que ser reconhecido globalmente como um país comprometido com o meio ambiente é fundamental para monetizar o crédito de carbono. “Um instrumento efetivo de proteção contra o desmatamento e uma fonte de recursos que poderia ser convertida em benefícios à população brasileira", diz Schalka.
Críticas internacionais
Internacionalmente, o governo brasileiro vem sendo duramente criticado. “A imagem externa afeta o ambiente interno de negócios”, afirma Alexei Bonamin, sócio de Mercado de Capitais do escritório TozziniFreire Advogados. “Não é uma questão de ideologia. Precisamos encarar o assunto de maneira técnica e pragmática.”
Há duas semanas, 29 instituições financeiras que gerenciam mais de 3,7 trilhões de dólares em ativos enviaram uma carta a nove embaixadas brasileiras dizendo que o Brasil precisa frear o desmatamento na Amazônia, sob risco de alimentar “uma incerteza generalizada sobre as condições para investir ou fornecer serviços financeiros ao Brasil.”
“Nós precisamos desse capital estrangeiro e ele tem ido embora”, afirma Gustavo Pimentel, diretor da Sitawi, especializada em investimentos de impacto. “No momento em que o governo fala sobre um plano de investimentos em infraestrutura em parceria com a iniciativa privada, não pode enviar mensagens trocadas.”
Risco às exportações
A deterioração da imagem do Brasil lá fora também prejudica as exportações. Empresas como a Natura, que recentemente comprou a Avon, terão dificuldade de acessar mercados externos de alto valor agregado, como os europeus, caso seus produtos sejam associados ao desmatamento. A Cargill, recentemente, teve suas rações bloqueadas por um dos maiores produtores de salmão da Noruega em virtude da presença de soja brasileira. “Para o agronegócio, essa é uma pauta fundamental. Produzir de forma sustentável é mais rentável”, afirma Grossi, do Cebds.
Ações de marketing ou campanhas publicitárias não serão suficientes para limpar a imagem brasileira da fuligem dos desmatamentos. Desde a Eco 92, no Rio de Janeiro, o Brasil assumiu uma série de compromissos internacionais relacionados ao clima — muitos deles surgiram por iniciativa do próprio país.
Para Nour Bouhassoun, presidente da Michelin na América do Sul, esses compromissos são prioritários e é para isso que a carta chama a atenção. “Estamos convictos de que não há futuro sem que tudo seja sustentável”, afirma Bouhassoun. “Além de uma ameaça à vida, que é o mais preocupante, o desmatamento ilegal causa problemas econômicos sérios, pois impacta diretamente diversos negócios e investimentos. Dessa forma, entendemos ser de fundamental importância a carta enviada ao vice-presidente da República.”