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Retrospectiva do Agronegócio em 2023

Opinião | Os principais eventos macroeconômicos e regionais que influenciaram as operações do agronegócio global neste último ano

Soja: o ano de 2023 revelou-se favorável para a agricultura e pecuária, apesar dos desafios enfrentados pelo setor, escreve Luis Otávio Fonseca (Getty Images/Getty Images)

Soja: o ano de 2023 revelou-se favorável para a agricultura e pecuária, apesar dos desafios enfrentados pelo setor, escreve Luis Otávio Fonseca (Getty Images/Getty Images)

Luis Otávio Fonseca
Luis Otávio Fonseca

Sócio-líder para a Indústria de Consumer e líder para o setor de Agronegócio da Deloitte

Publicado em 28 de dezembro de 2023 às 10h43.

Última atualização em 11 de janeiro de 2024 às 10h37.

Ao nos despedirmos de 2023, é essencial ponderar sobre as forças que moldaram a dinâmica nos mercados do agronegócio, suas complexas cadeias de suprimentos e o cenário das commodities agrícolas. Esta análise mensal explora os principais eventos macroeconômicos e regionais que influenciaram as operações do agronegócio global neste último ano, destacando, principalmente o cenário brasileiro.

O ano de 2023 revelou-se favorável para a agricultura e pecuária, apesar dos desafios enfrentados pelo setor, como taxas de juro globais elevadas, desaceleração da demanda e incertezas internacionais agravadas por conflitos entre países, além das mudanças climáticas que impactaram consideravelmente as perspectivas para a safra de 2024. O Levantamento Sistemático da Produção Agrícola (LSPA), divulgado pelo IBGE em junho deste ano, apontou um novo recorde na safra nacional de cereais, leguminosas e oleaginosas, totalizando 305,4 milhões de toneladas.

No setor pecuário, suínos, leite e ovos destacaram-se com contribuições positivas significativas. A balança comercial da pecuária registrou, de janeiro a junho, uma movimentação total de R$ 336,60 bilhões.

Estudos conduzidos pelo renomado economista-chefe do Institute of International Finance, Robin Brooks, indicam que a balança comercial brasileira permanece robusta, sendo positivamente influenciada pelo dinamismo do agronegócio. Essa correlação direta reflete-se na performance das contas públicas do país.

O ano teve início com evidente desaceleração econômica global, registrando queda de 1,8% no crescimento econômico global, conforme reportado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI)(1). Esse cenário levou as partes interessadas do agronegócio a antecipar possíveis impactos na demanda por commodities, adaptando suas estratégias para enfrentar um ambiente econômico mais desafiador.

No Brasil, o primeiro trimestre foi marcado pelas preocupações decorrentes da confirmação de casos de gripe aviária na Argentina e no Uruguai. Felizmente, tais casos não se confirmaram no Brasil, resultado de rigorosos protocolos de biosseguridade e de um plano de vigilância para detecção precoce da doença. Essas medidas contribuíram para manter a confiança dos importadores e permitiram ao país expandir suas exportações em 2023(2).

Em fevereiro, as pressões inflacionárias ganharam força, desencadeando um efeito cascata em todas as etapas produtivas do agronegócio. O aumento nos custos dos insumos agrícolas, incluindo uma elevação de 15% nos preços dos combustíveis e um notável acréscimo de 20% nos custos dos fertilizantes (3), levou as agroindústrias a reavaliar a economia da produção. O delicado equilíbrio entre manter a rentabilidade e assegurar acessibilidade para os consumidores tornou-se um ponto central.

O desafio global da inflação nos alimentos, intensificado por eventos como a pandemia e o conflito Rússia-Ucrânia, tem impactado o mercado internacional, resultando no aumento dos preços. Contudo, no Brasil, a produção recorde no primeiro semestre, impulsionada por condições climáticas favoráveis, contribuiu para o controle inflacionário.

A ampliação na oferta de produtos agropecuários resultou em uma diminuição nos preços no campo, refletindo-se em uma evolução consideravelmente mais moderada para o consumidor em comparação com outros setores. As exportações do setor também atingiram um patamar recorde, exercendo pressão sobre a valorização do real e fornecendo outro elemento de controle inflacionário. Apesar dos impactos positivos no cenário macroeconômico, alguns pontos de atenção incluem possíveis prejuízos para a margem do produtor rural e a incerteza internacional, ressaltando a necessidade de monitorar fatores como os riscos climáticos e geopolíticos para avaliar futuros desdobramentos.

Março e abril foram testemunhas dos impactos de longo alcance das mudanças climáticas, intensificando as preocupações com as interrupções na cadeia de suprimentos. Eventos climáticos extremos resultaram em uma redução de 7% na produtividade global das culturas, acrescentando uma camada de complexidade ao gerenciamento da cadeia de suprimentos(4).

Durante esse período, as taxas de juro globais entraram na equação, à medida que os bancos centrais em todo o mundo ajustaram as taxas para combater as pressões inflacionárias, impactando o custo de capital e influenciando o planejamento financeiro e as decisões de investimento dos operadores do agronegócio. No Brasil, observa-se a expansão da oferta de crédito privado(5) para operações agrícolas, em resposta à crescente necessidade de capital para custeio e investimento.

Maio e junho trouxeram os holofotes para os preços dos fertilizantes e cenários de demanda em mudança. A volatilidade nos custos dos fertilizantes impôs desafios ao agronegócio, que buscou otimizar os custos de produção, enquanto as mudanças na demanda global, influenciadas por eventos geopolíticos e alterações nas preferências dos consumidores, continuaram a moldar as estratégias do agronegócio.

Junho de 2023 também foi marcado pela resiliência em meio à volatilidade do mercado, exigindo do agronegócio a demonstração de resiliência diante dos preços das commodities e dos padrões de demanda em constante flutuação. De acordo com o registro do Instituto Mato-Grossense de Economia (Imea), matérias-primas como soja, milho e o valor por quilo da carne bovina têm apresentado queda nos preços desde o início deste ano, consequência dessa inconstância, mudanças na demanda global e foco maior nos custos dos fertilizantes. Diante deste cenário, a capacidade de se adaptar e inovar tornou-se fundamental para navegar pelas incertezas.

O mês de julho foi marcado por uma fase de recuperação em meio aos desafios persistentes na cadeia de suprimentos do agronegócio. Adaptações contínuas às interrupções causadas por eventos climáticos, transições tecnológicas e mudanças geopolíticas reforçaram a importância de estratégias robustas de gerenciamento de risco.

Destaque para a aprovação, na Câmara dos Deputados, da proposta de reforma tributária também em julho, baseada na PEC 45/2019. Essa reforma visa simplificar o complexo sistema tributário brasileiro e foi aguardada com expectativa pelo mercado. Posteriormente aprovada pelo Senado em novembro, a reforma introduz um sistema dual de Imposto sobre Valor Adicionado (IVA), chamado de IBS e CBS, com início em 2026. O agronegócio foi beneficiado com alíquotas zero para itens da cesta básica, além da isenção de IBS e CBS para produtores com receita anual abaixo de R$ 3,6 milhões. No entanto, a definição das alíquotas finais, aguardada por Lei Complementar em 2024, e a transição para dois modelos tributários preocupam o setor.

O Brasil, líder mundial em exportação de soja, carne bovina, açúcar, carne de frango, café, celulose e suco de laranja, recebeu projeções animadoras em agosto de 2023. O país está prestes a tornar-se o principal exportador de farelo de soja, superando a Argentina, e o maior fornecedor de milho, ultrapassando os Estados Unidos, conforme indicado pelo Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA).

Desafios geopolíticos

Setembro trouxe desafios geopolíticos que agitaram as dinâmicas comerciais globais. O Parlamento da União Europeia aprovou um projeto que proíbe a importação de produtos agrícolas ligados ao desmatamento, impactando diretamente o agronegócio brasileiro. Essa medida, que deve iniciar no final de dezembro de 2024, impõe restrições à exportação de produtos agrícolas provenientes de áreas desmatadas após 2021 para o bloco econômico. O setor agora enfrenta a necessidade de reavaliar o acesso ao mercado, impulsionar tecnologias de manejo sustentável e lidar com os riscos geopolíticos em suas operações.

Historicamente e cada vez mais, e mais presente em outubro, a intensificação da instabilidade no Oriente Médio gera incertezas econômicas, impactando transações no agronegócio de forma global e, também, local (países como Irã, Arábia Saudita, Egito e Líbano, afinal, respondem por 6% das exportações do agro brasileiro), além dos preços de insumos estratégicos, especialmente o petróleo, o que pressiona a inflação global. No mês de outubro, essa dinâmica não foi diferente.

COP28 e o agro

Em novembro, a COP-28 colocou o agronegócio em destaque nas discussões sobre alterações climáticas, sustentabilidade agrícola, combate ao desmatamento e produção de biocombustíveis. O Brasil destacou-se na área de combustíveis renováveis, posicionando-se na vanguarda de bioenergia e hidrogênio verde, com potencial de atrair R$ 200 bilhões para o país na próxima década.

Em conclusão, 2023 foi um ano de desafios e adaptações multifacetadas para o agronegócio global. Conforme as forças macroeconômicas continuam a evoluir, a adaptabilidade, tema recorrente ao longo do ano, permanece crucial. O setor agora projeta seu olhar para 2024, preparando-se para enfrentar novos cenários em uma paisagem em constante transformação.


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