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Com BNDES contra, Klabin vai buscar aval do mercado para comprar Klabin

Companhia decide convocar assembleia sobre acordo para comprar marca dos controladores em 30/10

Fábrica da Klabin: após nova negociação, companhia aceita pagar R$ 367 milhões à família por fim dos royalties (Klabin/Divulgação)
Fábrica da Klabin: após nova negociação, companhia aceita pagar R$ 367 milhões à família por fim dos royalties (Klabin/Divulgação)
GV

Graziella Valenti

15 de setembro de 2020 às 22:12

Mesmo sem o BNDES estar de acordo com a proposta, a Klabin decidiu convocar a assembleia de acionistas para aprovar o acordo anunciado em julho que pode extinguir o contrato que a obriga a pagar royalties à família pelo uso da marca — a maior mácula na governança corporativa da companhia e uma das situações mais esdrúxula do mercado brasileiro. O encontro foi marcado para 30 de outubro, portanto, agendado com 45 dias de antecedência.

A estimativa é que esse compromisso custe 67 milhões de reais à empresa neste ano, conforme contou o diretor financeiro e de relações com investidores da empresa, em entrevista ao EXAME IN. No ano passado, o gasto foi de 59 milhões de reais e de 52 milhões de reais em 2018. Nos seis primeiros meses de 2020, o Ebitda da Klabin cresceu 20%, para 2,36 bilhões de reais.

No fim de julho, dando sequência a uma novela que começou em fevereiro de 2019, a Klabin anunciou estar disposta a pagar 367 milhões de reais aos controladores, com a emissão de 92,9 milhões de ações ordinárias, para comprar definitivamente sua própria marca (sobrenome da família) e dar fim a um contrato de 25 anos que a obriga a pagar 1,37% da receita líquida das vendas de cartões e papelão ondulado. As ações serão usadas para incorporar a Sogemar, sociedade que detém os direitos, e equivalem a uma diluição de 1,65%.

“Há centenas de páginas de informações sobre o assunto, achamos melhor dar um prazo maior que o regulamentar para que os acionistas possam ter bastante tempo para se informar e se preparar. Vamos começar um road show para explicar o tema”, contou Marcos Ivo, diretor financeiro e de relações com investidores da Klabin, em entrevista ao EXAME IN.

O BNDES é o maior acionista minoritário da empresa, com 7,5% do capital total. Na assembleia em que o acordo será votado, os controladores beneficiados não poderão se manifestar — juntos, eles somam 45% do negócio. Com isso, é como se os votos do banco de fomento valessem o dobro, ou quase 15%. Mesma lógica vale para todos os demais minoritários. Será preciso aprovação da maioria da minoria. A BlackRock é outra grande investidora, com 4,4% do capital total — o que lhe confere uma participação de quase 8,5% na decisão do assunto.

Apesar dessa pendência na governança, a Klabin é negociada na B3 em sua máxima história. A empresa está avaliada em quase 28 bilhões de reais.

Em 2019, a Klabin havia proposto pagar o equivalente a 344 milhões de reais pelo fim do acordo, o que representava um desconto pouco superior a 50% sobre o valor presente do fluxo futuro de royalties. Os cálculos contratados da Deloitte apontavam que o contrato valia 702 milhões de reais para a família.

Ivo defende que, além de todo o processo de aprovação dessa versão da proposta ter sido melhor e mais adequado, houve uma melhora importante das condições financeiras. Nesse intervalo, ocorreram mudanças das condições econômicas do país e do mundo e ainda a compra de ativos da International Paper no Brasil. A Deloitte atualizou o estudo de 2019 e alcançou um valor de 1,046 bilhão de reais para o contrato dos royalties. Dessa forma, o desconto implícito subiu para 65%. Para completar, a diluição implícita diminuiu, pois a quantidade de ações necessárias para o pagamento caiu. Antes era 1,92% e agora, está pouco acima de 1,65%.

Em agosto, o BNDES fez uma sugestão de valor à Klabin para o contrato, um que ela estaria de acordo: 274 milhões de reais. Questionado sobre se houve uma negociação realmente engajada das partes a respeito da diferença de valores, Ivo frisou apenas que as partes do acordo são a Klabin, representada por seus administradores, de um lado e os controladores, representada por Sogemar, do outro. “O BNDES é um acionista, importante, é verdade, mas como outros também são”, diz.

O executivo destacou que para chegar até aqui, entre a primeira proposta de 2019 e a atual, foi feito um profundo trabalho de análise por um comitê independente dedicado apenas a estudar o contrato existente e as diferentes soluções possíveis para o assunto.

Quando o conselho de administração da Klabin avaliou o tema em julho, seis membros do colegiado votaram — todos independentes. A decisão a favor do contrato foi por 5 a 1. Mauro Rodrigues da Cunha era a favor da solução do problema, mas por um valor inferior, de 250 milhões de reais.  Dessa vez, foram cinco participantes, pois terminou o mandato de Amaury Bier  e o resultado deu 4 x 1. Rodrigues da Cunha mais uma vez sustentou sua posição e citou sua indicação anterior e a contraproposta do BNDES. Em julho, dos seis votantes, três (mesmo os favoráveis) registraram que seria importante buscar uma composição prévia com o banco de fomento.

O assunto corre o risco de, mais uma vez, não se resolver. A Klabin aposta na participação dos demais investidores. Quando anunciou a versão atualizada do acordo, os analistas de mercado se mostraram positivo com as condições — mais do que da primeira vez.

Em 2019, o BNDES não chegou a se manifestar sobre o valor. O banco estatal e a companhia tiveram uma pública e ruidosa discussão, que foi parar inclusive na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) — mais uma vez. A instituição deixava clara a insatisfação com a participação de conselheiros controladores e diretamente beneficiados no acordo na decisão e pedia mais informações sobre o tema, o que incluía a íntegra do contrato e estudos que pudessem servir de base comparativa, como valor da marca e até sobre o custo e o risco que haveria no cancelamento unilateral do contrato com a substituição do nome. Nada disso foi fornecido ou debatido em 2019. Então, o grupo de trabalho formado por conselheiros independentes, eleitos justamente por conta da situação, passou meses estudando o assunto , e reuniram laudos e entrevistas sobre a questão. A conclusão alcançada foi que o acordo de 2019 era vantajoso para a Klabin. "Foi com base nisso que negociamos", destaca Ivo.

A administração da empresa está bastante exposta nesse caso. A CVM está com os radares ligados para o caso. Em 2016, a xerife de mercado já havia solicitado que a Klabin tentasse resolver a questão dos contratos de royalties e pedia que, caso fosse feita opção pela sua continuidade, que houvesse uma justificativa, junto ao balanço anual.

Entre o fim de 2019 e início deste ano, o regulador decidiu processar os conselheiros de administração que aprovaram o acordo anunciado no ano passado, exceto um único participantes que se absteve de votar. Eles foram acusados de terem faltado com o dever diligência perante a empresa.

Ivo explica que o pagamento dos royalties deve alcançar  76 milhões de reais em 2021, em função do aumento de capacidade com a compra da International Paper. Outros 10 milhões de reais poderão ser acrescidos se a Klabin optar por, ao final do projeto de expansão Puma 2, adicionar uma máquina de cartão. Está nas mãos do mercado aceitar ou não a nova proposta que está na mesa, negociada pela empresa.

 

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